Um anjo sentado na alta torre cinzenta.
Em frente ao sinal, lixo aberto esparramado no chão.
O fim do mundo no horizonte.
Tenta olhar com juízo, para que não se soltem as partes.
Os carros engarrafados e as pessoas cruzando entre eles (sem sinal) - um caminhão com fumaça negra.
Caminha com o diabo, vão às compras.
Caminhões enormes parados na faixa de segurança, fazendo as pessoas passarem apertadas no meio dos carros.
Uma cascata de esgoto escorrendo no arroio; lixo na ponte.
O anjo não canta, mas sabe que nem tudo é economia.
O diabo diz que é a natureza. Ele diz um poema.
Calçadas estreitas, sujas, esburacadas, pessoas se amotoando.
Tenta lembrar do que veio antes, um outro amanhã.
Um turista alemão tirando foto de linguiça.
Camisas amarelas chamando por revolta.
Uma fachada belle époque pichada, com mato crescendo dentro e uma placa: vende-se.
É preciso fazer o comércio algo épico. "Os empreendedores são os que levam o país", diz um rapaz.
Muitos óculos lilases, azuis e amarelos.
O anjo olha outro modo de ser que não seja vender.
Um homem sem camisa, magro, tatuado, rasgando papelão em frente a uma montanha de lixo.
Um jovem ambulante dizendo: eu não sinto tesão por mulheres chinesas.
O diabo imagina uma fogueira de livros, chama por Jesus.
Uma moça oriental de minisaia canta ópera com fones de ouvido.
Olhos fechados - em algum lugar uma árvore é do tamanho do céu.
Os risos e a música.
O anjo e o diabo sentam para tomar um café.
Afonso Lima
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