a radiação rebelde que levou as cidades?
o caos temperamental do vírus?
todos estão mortos e as cidades
repousam de uma longa estafa
ocas e mais serenas
Mas ainda assim caminham.
as cidades produzidas sentem passos sem peso
- eram as almas a pesar, seu lado tóxico decantado
engarrafados motoristas de rostos imóveis
ainda mandam mensagens de texto
ainda anseiam, famintos, mais e mais
mortos na foto
O frio, um mau cheiro - os átomos mais leves
há muito haviam fugido - mãos dedicadas muito brancas
dissertações defendidas, reuniões de comissão
um tumulto na promoção, barras de vestido de noiva
mecânicos mortos sem um sonho mínimo
tudo estava igual entre reis e plebeus, só cada qual
tinha uma diversa etiqueta
tristes destinos em movimento, medo de tentar e partir
meticulosos cálculos, e, ao olhar pensativo de uma rua
pareceria talvez que somente a vibração elétrica
do novo já antigo podia parar por um instante
o fluxo do homogêneo; intocados cafés da manhã
repetidos por hábito - vidros transpararentes, os mortos
talvez tenham morrido, secado, num longo processo
em que - quanto menos eram vistos,
quanto mais esqueciam, e já não sabiam o norte
mais brinquedos ganhavam e jardins
Mas como sempre a esperança ou o que seja rastejava
Brotando entre fios de verde no negro úmido
Quem sabe novas casas, novos tipos de porta?
O sol que ainda cai sobre ramagens
Cada folha, que insiste em ser diferente
As sementes que insistem em apodrecer
Afonso Lima
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