Meu amigo, não fique brabo por eu ser um neo-reaça, um niilista anarquista. Eu nunca tive História na escola. Meu pai apoiava a ditadura. Meu avô vendeu loteamento-empilhado na periferia e dizia que transporte coletivo era coisa de pobre. Meu bisavó foi traficante de escravo como todos os homens bem sucedidos. Eu leio e assisto realidades-editadas, dispersar e desviar a revolta - sou classe média reinformada, usada historicamente pelas forças mais reacionárias para resistir às mudanças. Eu sou gostoso e você também, vamos pra esteira, foi o que nos restou. O sol está bonito. Tem um show amanhã. Sim, agora é cidade-investimento de fundos internacionais e políticas urbanas para obras-de-carro, como o túnel de 3 bilhões e a louca obra do novo engarrafamento da marginal, 1 bilhão. F@d@-C. Meu amigo, eu não me importo se o novo século é o de rentistas e escravos, se a divisão do trabalho fez a academia discutir rizoma e significante no fim do mundo sem atrito com o redemoinho centrípeto que expulsa continuamente, se vivo no gueto artístico-intelectual enquanto uma cúpula empresarial domina as cidades. Vamos andar com nosso cachorro. Vamos beber um café. Vamos comprar um sapato. Nesse contexto de fragmentação da cidade e do pensamento, participação cenográfica pós-ditadura, população ausente, política morde-assopra de quem reclama, sociedade de desinformação e bloqueio comunicativo, o inconsciente coletivo de classe é a exclusão, o orgulho da nação é senso-comum. Falo do ponto de vista da propriedade, quero ser gerente no totalitarismo capitalista. Já chorei quando vi gente despejada na TV, mas não dá pra chorar todo dia né? Metade da cidade vive na favela, e daí? A cidade é inerte, nós também, tenho capital-intelectual, odeio ver pobre e quero ler um livro, plantar uma árvore e casar com você.
Afonso Lima
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