Ideologia do Luxo
Na novela “Cobras e Lagartos” a personagem de Thaís Araújo chama um pretendente de “baixa renda”. Não é a troco de nada que o nome da loja é “Luxus”. Lembro de um diálogo que ouvi certa vez no ônibus entre duas meninas com aproximadamente 13 anos, moradoras de um baixo distante. Uma delas dizia:
- Eu vou fingir que vou dormir na tua casa e fico com ele. Ele vai me levar na lanchonete e comprar um hambúrguer e batatas fritas grandes. Ele ganha 70 reais por semana e vou fazer ele gastar uns 30 reais comigo. Depois faço ele comprar uma bolsa que eu vi.
Eu fiquei pensando: é assim que se fazem bebês na adolescência. Uma prostituta sairia mais barato. O que estamos fazendo com nossos pobres, encharcados da ideologia do luxo? Antigamente as pessoas tinham a ideologia da Igreja, e mesmo tendo terras muitas vezes viviam uma vida de miséria e resignação. Hoje mesmo sendo ricos, jogadores de futebol, músicos famosos e novos ricos pensam em consumo estéril e infinito.
Na novela aparece um personagem chamado Foguinho pede dez pratos de jantar, correntes de prata e compra lojas inteiras de videogame.
O consumo agora é infinito. Um carro pode custar 1 milhão de dólares, um quarto de hotel, como o da seleção, 4 mil dólares. (Não há nada de errado em termos conforto, claro, mas o que se vê é uma ideologia do "rale-se os outros", uma cultura da solidão).
Estamos criando o mundo dos VIPS e o mundo dos “invisíveis”. A idéia é de que existem pessoas bem diferentes, com possibilidades bem diferentes, como aparece no seriado A Diarista quando a avó da família onde a protagonista trabalha lhe dá um relógio quebrado e diz: “eu sei que vocês pobres dão uso pra tudo, né?”
Quem trabalha com serviço voluntário já assistiu essa cena muitas vezes, até de órgãos governamentais. É um ciclo que se fecha desde quando o cristianismo criou a idéia de igualdade, opondo-se a hierarquia patriarcal da antiguidade. (Enquanto isso, nessa era do político-ator, uma mistura de Maquiavel com McLuham, como Reagan e Schwarzenegger os políticos conservadores, a cada dia, retornam com as mesmas idéias de “agora faremos melhor” sendo que nunca fizeram...)
As pessoas sem acesso a informações mais ricas acabam aceitando como normal esse mundo onde o “baixa renda” é desnecessário, e tentando adquirir o “símbolo” do alta renda individualmente. É a guerra de todos contra todos?
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