Prêt-à-Porter 8
Fui ao Sesc Consolação assistir a famosa saga do mestre Antunes. O prêt-à-porter ("ready to-wear", traduzido como "pronto-a-vestir" em Portugal") surgiu quando a moda de alta costura -baseada em uma aristocracia que gostava de ser aristocracia- foi se desfazendo e a nova sociedade que não exigia exclusividade se desenvolveu. Hoje, pelo movimento estranho do tempo, a exclusividade ja está de volta, seja na customização, seja na marca "moderninha". As cenas do grupo de Antunes remetem a uma dessacralização semelhante do teatro, e, ao mesmo tempo a diálogos possíveis em tempos de silêncio.
Digo isso porque, como já comentei, em POA parece que tudo tem de ser muito sério, a prova de alguma teoria, algum conceito, e, em alguns momentos, sentimos que somente valeria um teatro com todos nús, gritando e recitando algum texto beckettiniano. A leveza desse Prêt-à-Porter vem a calhar. Experimentos.
Ponto sem retorno, com Emerson Danesi e Marcelo Szpektor, mostra a quase-relação de dois homens, encontrando-se depois de 10 anos de colégio. A naturalidade dos atores é bem construída e reflete o desprendimento do cenário, básico. (Essa é a versão que Antunes dá ao trabalho com Stanislavski). Como Danesi consegue nos transmitir um amor abafado e Szpektor o medo do homem contemporâneo em não ser o que deve. O diálogo é vovo e corrido, natural. Eu sugeriria maior tempo entre as falas, para criar maior tensão. Também seria mais interessante se tivéssemos uma certeza, qualquer, seja de que eles se amaram e se amam ou de que foi apenas uma coisa do passado e passou. Fica um pouco entre o armário e a Parada.
Exiladas é o melhor texto, com Marília Simões e Aline Filocomo. A personagem "avoada" vai mostrando o quanto somos tolos em nossa produtividade. São grandes atrizes. É a cena mais profunda e chega a tocar o tema da morte, com muito humor.
Velejando na Beirada, com Marcelo Szpektor e Pedro Abhull retrata uma divertida partida verbal sobre a partida, dois amigos falando da morte. A proposta é hilária e o texto agradável, mas ficaria ainda melhor se depois do "discurso de corpo presente" fosse mais curta, o tempo, neste caso acaba sendo devorador. O diabo está nos detalhes e, too much, veste Prada.
O mais interessante desse espetáculo é que o "pós-moderno" aparece francamente: o representar está representado pelo "ser" e "estar", dialogar, e não pelo fingir. Tudo é feito ao vivo. Quando a moda vira tam´bem um modo de excluir por ser "in" e cria pessoa fora do "novo", falar com um amigo é revolução. Cada vez mais parece-me que atuar hoje é viver, viver com sinceridade, num mundo onde todos estão de alta costura. E "estar" hoje é o próprio processo da individuação, que Antunes gosta, é estar humano entre humanos quando tudo é pose e afetação. Pronto à vestir e a desvestir.
Um comentário:
Parabens Afonso! Adorei o teu blog Bem sacado os teus comentários assisti esse pret do Antunes em sampa no ano passado.
Mas o que me traz aqui é a tua crítica para "no vão da escada".
Caraca! Sincronicidade é isso aí.
Amei o teu comentário. Tenho um workinprogress de Dias Felizes do Beckett> Dê uma olhada no meu blog e veja o motivo do meu entusiasmo no meu blog de artes cênicas:
http:artescenicas.blogspot.com
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