Andavam de mãos dadas,
escreviam cartas belas, saíam juntos pelo bosque ou rezavam
sozinhos, mas lembravam das regras de São Cassiano, do século IV,
para anular o corpo e do imperador Justiniano, do século V, que
afirmava que pestes, fome e catástrofes vinham de uma população
libertina. Um dia, os dois monges falaram na capela:
- O Santo Aquino defende a família
natural
A luxúria é sujeitar-se à matéria
escura
Sem educação e sem prole, surge o mal
Por desperdiçar sêmen Onan foi pra
sepultura
Nas areias da província romana
Entre a concubina e a gramática
Viveu também Agostinho a bela
prática
do amor caridade e chama
Por que encarnou o Filho se a carne
é maldade?
Se o bispo de Paris condena a
alegria
Esquece que o próprio Agostinho
teve seu dia
O bispo
condena
quem acerta: 'destrói a virtude a castidade'.
- Agostinho chorou a morte, com alma
aflita
do amado, sua outra metade
Mas chorou ter sujado com desejo a
amizade
São as heresias que pregam amor dos
sodomitas
A natureza pensou em procriar –
pensa Tomás assim
O homem não existe para si
Tudo em Aristóteles tem um fim
Sem ordem o mundo se prostitui
Talvez nossa ciência esteja errada
Em ver em tudo uma razão dada
- Os filhos de camponeses pobres
Vem para Paris atrás de doutrinas
nobres
E acabam por cair nas calçadas
Em farras, bebedeiras, orgias
descaradas
os astros são movidos por seres
celestiais
E buscar o eterno cabe aos mortais
Assim falas monge angelical
Porque não conheces os labirintos
da mente
A solidão da noite e a tortura
fatal
Quando o homem explode sua semente
Tua língua de fogo hoje acenderei
Nos meus braços saberás o que
sei
Afonso Lima
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