O jovem Hans tinha um talento para
aquarelas. Pelo menos foi o que lhe disseram, na praia, as tias
animadas no almoço em frente ao mar. Ele passou aquela noite no
quarto desenhando, e tiveram que chamá-lo duas vezes para o jantar.
Entre um charuto e outro, seu pai deixou claro que isso seria
impensável. “Temos um nome nessa cidade, não viverás com a renda
de um artista”. Seus sonhos se despedaçaram mal formulados. Ele
passou no vestibular, dedicou-se com afinco aos estudos de advocacia.
Conquistou algumas meninas com suas camisas pólo de marca, aprendeu
a dirigir bêbado, conheceu os meandros de Miami e já se via como
herdeiro do pequeno império, confiante da sua superioridade. Adotou
até o modo de falar de seus tios, ao referir-se aos “bárbaros
inferiores”. Infelizmente, um ano depois de sua formatura, quando
ia ser efetivado no escritório de um amigo do pai (“não podemos
dar de bandeja uma posição”), caiu doente.
Pálido, febril, sem nada que pudesse
ser diagnosticado, recomendou o médico da família que fosse para a
casa de campo. Durou seis meses e cento e vinte aquarelas. Hoje elas
estão na coleção do Museu Nacional.
Afonso Lima
Afonso Lima
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