A cidade era um monte de ruínas. Era perigoso sair para buscar comida. As crianças se atreviam a brincar entre escombros, mas corriam para casa ao avistarem algum estranho ou ouvirem aviões. No cair da tarde, o céu violeta, um batalhão chega para passar a noite. Já ninguém se atreve a fazer muitas perguntas. Pediram água, o prefeito fez chegar no acampamento tinas de água, que gasolina já não havia. Linguiças feias. Luz, há muito, durava quatro horas por dia. O medo é como uma fina poeira na noite seca. O chefe tinha marcas nos dois pulsos. Quiseram a presença de músicos. Os homens foram trazidos na praça, o velho tocador de flauta, os dois meninos do tambor, o cantor. Os oficiais batiam os pés discretamente, depois dançaram como crianças. Aos poucos algumas almas arriscaram se aproximar. As mulheres, com medo, olhavam por detrás das frestas, das colunas, na escuridão. A lua estava alaranjada, grande. O cantor lembrou de uma mulher que se apaixonou por um soldado, que foi embora e a deixou sufocando de tristeza. Um dia, ela soube que ele casara. Os homens fizeram um momento de silêncio. Ouviu-se o vento nas montanhas.
Afonso Lima
Nenhum comentário:
Postar um comentário