A primeira impressão que eu tive foi que alguém errou a entrada e tentava abrir a porta de vidro fechada. Depois o rapazinho começou a beijar o vidro. O garçom fez um sinal e foi chamar alguém. O menino continuava como que forçando a entrada.
Depois o segurança apareceu, e ele já estava longe.
- São os sem-teto - disse o segurança para alguém quando saímos.
Imaginei o que deve ser para uma criança que está acampada na rua, sob plásticos pretos, porque o presidente achou melhor destinar o dinheiro das casas populares para pessoas com renda acima de 4 mil Reais - o que deve ser ver gente comendo sopa, bebendo chocolate, comendo pizzas deliciosas.
(A verdade é que a pichação deve começar aqui: uma voz).
Quando comentei sobre isso com uma amiga querida, mas que nasceu rica, ela disse:
"Não acredito mais em notícias da esquerda".
O isolamento e a segregação nos fizeram entrar num quadro de adoecimento coletivo, no qual uma análise imparcial é impossível. Além da tese filosófica de que inexiste "neutralidade ou superioridade epistemológica" precisamos ter espaços coletivos de acordo, nos quais a mais razoável verdade prevaleça: o jornal caiu no mais obscuro marketing; as instituições parecem surdas aos apelos do povo; a polícia reprime manifestações.
Quando a elite toma para si uma "mentira racionalista" e insiste nela, o que temos é guerra. Políticos-celebridade apelam a nossa emoção, levantam nossa moral, não importa o resto. O "resto" pode ser violência com judeus e comunistas?
O país foi varrido pelo ódio de classe média. Ódio médico, ódio legal, ódio empresarial. Fui recentemente expulso de um grupo no Facebook que defendia um parque na cidade. Motivo? Por que falar mal da atual gestão, essa do vende-se?
O partido há vinte anos no poder usa da repressão da verdade e do sistema de silêncio para não fazer quase nada e manter-se no poder como "inovador".
O partido há vinte anos no poder usa da repressão da verdade e do sistema de silêncio para não fazer quase nada e manter-se no poder como "inovador".
Em outro grupo de bairro, fui ameaçado. Num terceiro, "você só fala de um partido". Interessante é que esse partido sofreu quatro anos de bombardeio da mídia e ninguém sabe as coisas que fez: calçadas, proteção aos dependentes químicos, iluminação, creches... A sensação é que "é tudo igual". A classe média regrediu para a negação.
O resumo de tudo isso é que a classe média vive num mundo paralelo. Até que esse mundo não apenas beije o vidro - mas jogue uma pedra nele.
Afonso Lima.
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