A fila foi parada pelos guardas na sua vez de entrar. Lá dentro, 300 pessoas representando 11 milhões.
Algumas pessoas insistiam, os guardas diziam que o telão iria transmitir. Era a última apresentação das metas da Prefeitura. Assistiram um pouco no telão. Toda a cidade em fúria. Mas que importava isso? A comunicação era pelas redes e pela mídia com a "massa".
Foi tomar um café com um conselheiro de bairro, acabaram de se conhecer na fila.
- É chocante, será que não havia outro espaço? Tanta gente ficou de fora...
- Fizeram 39 audiências em 3 dias.
- Eu penso no que aconteceu com a política. Os vereadores eleitos pela enxurrada de dinheiro e o prefeito, idem, parecem não se importar em nada com as demandas da sociedade.
- O que aconteceu foi mercado financeiro. E parece que a elite percebeu que ninguém tem compreensão. A classe media virou tecnocrata, a maioria dos pobres trabalha demais ou se tornou novo rico. O discurso da TV e do jornal pode apagar qualquer alternativa, tudo é culpa da "gastança", da "farra social".
- Tenho ouvido cada coisa... No grupo do bairro se diz que "cultura de verdade não precisa de investimento público", critica-se o "o vitimismo das minorias", ou se diz que "reduzir investimentos é essencial porque dinheiro não dá em árvores". Ouvi esse provérbio: "Em casa que não tem pão, todos gritam e ninguém tem razão".
- A impressão que eu tenho é que nossa sociedade cortou os vínculos. O soldado mata à distância como num jogo da morte. Os acionistas lidam com números, mas esses números são uma mata cortada ou uma barragem que destrói a água de cidades inteiras. A classe A, vivendo em seus palácios cercados, pode apoiar os políticos mais sorridentes na rede, sem ver o que significa o corte que aplicam nos investimentos públicos.
- Eu estava em Nova Iorque na época do "Ocupem Wall Street". Eles falavam do "cartel dos bancos" e "senhores dos governos". "Eles colocam os seus no governo", "a dívida dos governos é aplicação". Uma jovem disse: "A nova ordem internacional imposta ao mundo foi uma conquista imperial pela abertura dos mercados de capital". As pessoas diziam na praça que cada um dos 28 grupos financeiros que mandam no mundo tem um PIB maior que o do Brasil. Nem Obama conseguiu recriar leis de regulação. O capital é global, o governo é local. Ouço uma mulher gritar para uma manifestante: "Bando de picaretas, vão procurar emprego". E a outra responde: "Eu tenho emprego, o que eu não tenho é uma vida".
Na rua, jovens negras de um coletivo saem da audiência conversando.
Começava uma fina chuva, mas o sol ainda brilhava. Resolveram ficar mais um pouco.
Afonso Junior ferreira de Lima
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