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terça-feira, novembro 15, 2016

Conflito criador

- Adeus, América - disse Mr. Bigode enquanto acendia o charuto na cadeira de vime no jardim.
- A democracia-show venceu. Pelo menos, por ora.
Maria Lúcia servia a limonada para os dois homens de sua vida. Ela se sentia elétrica, assustada, agressiva e em choque. Mas precisa respirar e tentar entender... A democracia não era o que achava. Sentiu-se em meio à ruínas. A América corporativa-arcaica.
O jovem adolescente parecia desligado. Estaria armando uma revolução pela internet ou jogando vídeo-game?
Mr. Bigode já tinha muitas opiniões:
- Sociedade baseada em slogans. São camadas de conservadorismo, e além do conservadorismo, fascismo. Empresários pensando em como acabar com os salários. Trabalhadores empobrecidos contra trabalhadores mais empobrecidos ou desesperados de outros países.
O filho se joga na piscina.
- Ela foi ferida porque não conseguimos um dos três princípios - além da participação e da, digamos, justiça imparcial - para fazer com que ela andasse: a informação sadia para o julgamento correto.
Maria Lúcia tirou as sandálias. Sentiu a grama. Havia o drama de o filho não se importar com o negócio do pai - uma padaria. Uma ótima padaria, doces, almoço, pães, vendiam muito bem. "Você devia se importar, você depende disso", dizia o pai.
- Penso se a mídia, preocupada com desconectar uma coisa da outra, gerou o sistema de fragmentação do pensamento. A mídia, chego a essa conclusão, não serve para informar, mas para gerar um estado de emergência contínuo.
- Eu sou contra a ocupação das universidades - disse o filho.
Os pais olharam um tanto chocados.
- Quero estudar.
Ela sabia que seu filho era eco-ativista, ciclista e respeitava as minorias.
- Eu sei o que significa essa PEC, mas mesmo assim quero estudar.
Ela pensa que o medo nos leva a tomar as decisões mais rápidas. Ou seja, controlar os pobres e deixar como está o resto.
- Enfraquecer as massas - disse o pai em telepatia.  Se o trabalhador se informar e tomar decisões, será mais forte e vai exigir direitos. Meu pai sofreu muito com o fascismo na Espanha. Eu sou pequeno empresário, mas não sou fascista.
- Eu não quero pagar imposto. Meu professor diz que o conservadorismo é uma doutrina válida - o filho respondeu.
- Os bilionários não querem pagar imposto... Os trabalhadores empobrecidos precisam do Estado, mas também não querem imposto. A base disso tudo é o principio de solidariedade...
 - O imposto alto é o que faz as empresas americanas irem para o México, diz o filho. Um orçamento equilibrado é o que pode nos salvar.
A mãe pensou que aquele menino não tinha poupado trocados para pegar o ônibus para a universidade como ela. Como haviam ficado tanto tempo sem se falar? Bom dia, afinal, não era diálogo.
- Filho, ela disse - O problema é que os avanços dos partidos à esquerda nunca são mostrados na TV. É o bloqueio. Assim ficamos sem julgamento.
O rapaz respondeu:
- Não me interessa apenas julgar que alguém podia ter feito e não fez. Quero mudar o sistema que amarra até quem quer mudar.
O pai, vermelho, disse:
- Eles acham que o Partido Democrata - esse, da Wall Street - é  extrema esquerda, loucos totalitários com dinheiro do George Soros. O movimento pacifista dos anos 70 é o mesmo "comunismo dos antiamericanos" de sempre e o Occupy.
- Eu quero a liberdade de decidir. Eu vou lutar pelo que eu acho certo. Eu não sou um animal ignorante.
O filho saiu.

Afonso Lima

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