Eu estava meio zonza, os canapés, a música, conversas leves, a arte política de Verônica Esquizy nas paredes: "Sem por Q".
A exposição do representante do banco sobre a artista rebelde que revelou o estado latente do totalitarismo colonial.
Sentada em um canto,senti alguma coisa na garganta, e queria sair pelas ruas chuvosas e escuras em busca de lógica.
- Adoro o azul da luz, causa uma sensação de instabilidade.
Mas não há lógica. Ao lado, se vê sujeitos quase festivos, uma seriedade opressora, o poder emanando de um conceito borbulhante.
- Acredito que a polícia foi um avanço, porque os inimigos estão por toda a parte.
- A prata me lembra o autoritarismo do mundo da moda.
- Para mim, é claro que deve existir zona especial. Não se pode ter uma lei comum entre pessoas ordinárias e casos excepcionais.
Ela decide ir ao banheiro.
Algo como serpente de escamas frias empalhada com míssil sangrante no peito agora na xícara da lojinha.
Quase bate em um garçom enquanto escuta uma advogada dizer:
- Prisão preventiva é a defesa da sociedade contra o silenciamento.
Vomita. Respira.
Batom vermelho.
O diálogo. Interessa quem manda.
O caderno de memórias da tia, sobrevivente.
"Meu namorado ter me abandonado foi o primeiro sinal. Não consegui pensar em algum motivo, nem ele saberia explicar. Era vergonhoso demais que fossemos quem éramos".
Havia alguma coisa viva se contorcendo.
Pelas ruas chuvosas e escuras.
Afonso Lima
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