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terça-feira, agosto 14, 2007




Classe Média desesperada

Sim, eu fiquei 2hs esperando o avião em Guarulhos. Que drama! Um local limpo, amplo, envidraçado, com café, suco e cadeiras confortáveis (era só subir a escada rolante, mas teve gente, muita, que preferiu ficar sentada no chão não sei por que, vai que aparece a televisão).
Cinco dias depois do desastre, o Aeroporto de Cumbica normal, tranqüilo, vem um velhinho com uma mala, o repórter “pula” nele e pergunta: “como o senhor se sente?” (entenda-se: estressado, desesperado, a beira de um ataque de nervos). O velhinho apenas olha para os lados (tudo vazio) e pergunta “como?”

Entrevistei dois profissionais do aeroporto, um deles que há 20 anos lá trabalha. “Esse acidente não tem nada a ver com a pista. Decolam vinte aviões por hora. Qualquer um sabe que foi falha da máquina, mas isso significaria dizer que a empresa não faz manutenção.” E sobre os atrasos: “Todos sempre fizeram overbook, mas antes outra empresa arrumava esses passageiros. Agora todas fizeram ao máximo, faltou vagas.” Não seria óbvio?

Depois, no Salgado Filho, uma mulher vestida de executiva de nariz de palhaço. Lembrei de meu tio que sempre falou de atrasos em aviões, há décadas.
Na TV, um pai (compreensivelmente) confuso diz: “Meu filho foi sacrificado!” Pela ANAC? Uma senhora distinta, deitada no chão no Portão de embarque: “Nunca saí para reclamar nada, (um francês diria, mesmo, sem 68, sem auxílio desemprego) mas agora CHEGA!”

A mudança na malha aérea que o novo Ministro propôs vai “fazer o consumidor pagar mais” o segundo o JG. Os 40 integrantes do Movimento Luto Brasil (não foi fundado pelos familiares das vítimas) que "vaiaram o ministro da Defesa, Nelson Jobim, em frente ao Palácio Piratini, em Porto Alegre" (Terra) saíram em cadeia nacional, no maior Jornal do país.

Seguindo o JN hoje:

“A CPI cobrou da TAM por que não seguiu uma instrução da Anac de janeiro que recomenda o uso dos reversos no máximo, quando a pista estiver molhada no aeroporto de Congonhas. Para surpresa dos deputados, a TAM disse que nunca recebeu a instrução. (...)

Mais surpresos ficaram quando o presidente da Anac, Milton Zuanazzi, reconheceu, por telefone, que a instrução, publicada no site da agência, não tem valor porque não chegou a ser regulamentada.”

Alguém podia me esclarecer o que a ANAC pode fazer, na realidade? Ela pode bater na porta da TAM e fechá-la? O que significa “Não pode ser regulamentada”? A TV não quer esclarecer isso?

Se nosso país, é bom lembrar, está o que está é justamente porque, como um colonialista no Haiti, houve quem ajudasse grupos minoritários a tomar o poder e evitar a distribuição de renda que ocorreu em parte na Europa e EUA, e não porque a maioria votou em um barbudo operário em 2002.

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Desesperadamente Fiel

Assistindo às primeiras cenas da mini-série que estréia amanhã, Donas de Casa Desesperadas, ficamos pensando o que a Rede TV trouxe de novo além das fofocas. O seriado se passa em um mundo de casas com jardim (Arvoredo), onde mulheres “desesperadas” cuidam das flores, dos filhos na piscina, jantam em salas enormes, etc. Muito bem, para se começar no ramo do entretenimento é preciso se valer do que já existe. (Hei, têm alguns dramaturgos brasileiros aqui!)

Claro que essa série é uma das mais inteligentes dos últimos tempos, porque a competição exigem sim qualidade nos EUA e a classe média que sai cada vez menos de casa porque alguém não pagou o imposto para investir na Bolsa e não temos segurança, precisa e adora.

Mas, convenhamos, qual a vantagem de se ter o mesmo seriado dublado? Você tem de olhar duas vezes para perceber que não é uma gringa e sim Lucélia Santos. Percebemos o quanto o modelo de família, homem, mulher norte-americanos se torna “global-normal”, quando nossos atores de 1,90 e malhados e nossas mulheres dos outros falam em português. Parece outro assunto, mas não é: é sobre alguns viverem NY-SP enquanto outros vivem favela-Tv aberta. Prefiro a Grande Família...

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PS: Depois do fato, seguem as mesmas opiniões: ruas impecáveis, com postes antigos, meninos de sete anos em camisa social para ir ao enterro, mulheres em roupões no meio da rua segurérrima à noite vendo a mansão da amiga ser salva pelos bombeiros (você já viu uma cena assim no seu bairro?)... A série acaba fazendo pensar que existe um grupo de pessoas- talvez como a própria Gimenez, que parece passar o fins de semana em Nova York- vivendo sim naquele mundo "de plástico", em condomínios fechados em qualquer lugar do mundo, sem compreender o mínimo dos "surpreendentes" momentos como um ataque terrorista ou uma crise no mercado imobiliário fantasma porque simplesmente passaram tempo demais sem a realidade.
O que mais choca é a naturalidade das "piadas": chega-se a um enterro com uma cesta de pães de mel, toma-se café em bules de porcelana, leva-se grandes buquês de lírios na mão. O exagero das regras da Disney chega ao cúmulo quando, tendo por algum motivo sido gravado em Buenos Aires (equipe mais "entrozada com os métodos de produção" hollywoodianos? mais barata? autorizada?), uma atriz é forçada a fazer uma cena com um vestido de seda num frio de 3 °C (frio que toda a equipe comenta na festa de lançamento), outra fica nua um dia inteiro na cidade cenográfica. Se foi feito na Argentina (vimos isso antes em Chiquetitas, mas aí era ridículo sem comentários), por que esse calor Californiano?
(As atrizes, maravilhosas, souberam dar um jeito brasileiro no meio de tanta estética publicitária. Isadora Ribeiro disse que não assistiu os episódios para não copiar- e está mesmo uma das melhores.)
Onde está a mulher brasileira, solteira, trabalhando três turnos, presa no trânsito e com tendinite? A naturalização do padrão americano de ser rico. A síntese desse agradável clone foram os filhos dublados. Dublados mesmo! Vozes enlatadas como os motoqueiros do Casseta e Planeta, trocando sílabas. Isso que dá tantas normas para filmar, regras em contrato: técnica perfeita, mas não é a nossa.

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