Essa janela de madeira alta,
escura, me lembra a casa da minha infância. Uma casa verde, depois
lilás, amarela, aquela cidade calma e tranquila. Eram peças
enormes, portas altas de madeira, eu nem conseguia fechar o trinco de cima, quando ia estudar no escritório. O quarto do pai e da mãe era
tão grande que dividiram no meio e fizeram meu quarto. No corredor,
sua vó tinha plantas. Todo ano tinha alguma reforma, eu nasci em
meio a reformas. Minha mãe durante o dia, fazia doces, visitava
amigas, andava no jardim plantando, dava ordens sobre a casa. A Dada,
ela veio morar com nove anos com tua vó, a Dada ajudava nas
encomendas, limpava a casa, depois aprendeu a costurar, tinha orgulho
de ter o próprio dinheiro. Quando eu nasci, seu avô ja era
aposentado, se aposentou jovem, acho que por causa das guerras. Ele
entrou para o exército com 16 anos, o avô dele conseguiu, uma forma
dele se sustentar. Ele passava o dia lendo, cuidando dos carros,
pescando, cuidando das reformas, pensando nos próximos acampamentos
nos quais iríamos na Lagoa Mirim, no Uruguai ou outro lugar.
A mãe
era querida por todos, ajudava Deus e todo mundo, mas em casa, às
vezes, era dura. Uma vez perguntei para minha avó porque minha mãe
era assim tão severa. Filha de fazendeiro, me disse vovó Edwiges.
Eu e meu pai ficávamos na beira do rio, o céu ia ficando escuro.
Uma vez eu tropecei numa rua de pedra, quebrei os dentes. Meu pai me
abraçou forte. Eu me lembro dos olhos claros do meu pai, quando o
sol batia de frente, e como ele era elegante quando os dois saíam
pra dançar tango. A vovó Edwiges, que era cozinheira, cuidou das filhas, o menino ela entregou
pro avô no sul. Ele vendia pastel para ela quando criança. Eu me
lembro da chuva no telhado, eu pequena na cama, choveu assim quando
ele morreu. A gente vendeu a casa e veio pra capital. Até hoje sonho
com essa casa, a costura da Dada, o vento, estranho como alguns
locais se fixam na gente, e nem são às vezes coisas tão
relevantes, são pedaços apenas, mas que voltam e voltam. Aqui, essa
casa me lembra muito, e desse tempo que era lento, a gente tinha
tempo. Eu me sentia tranquila.
Afonso Lima
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