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sexta-feira, outubro 12, 2018

Um Brasil vergonha

Jornalista argentino revela como as Forças Armadas construíram a candidatura de Bolsonaro para chegar ao poder


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O Brasil vive momentos de tensão.

Um amigo diz que perdeu a aula porque está "atordoado".

Uma senhora diz: "Perco as coisas, fui sair de casa e tive uma crise de choro".

Na periferia, ameaças. "Aproveite a vida até dia 28".

"O mito chegou", disse um adolescente no meu Face.

Conversando com um trabalhador, ele me diz: "Não tem problema, o Parlamento vai ajudar". Ou seja, o presidente fascista será contido. 

Os ataques à liberdade de expressão já não podem ser ignorados. 

Surgem muitas reações - espalhadas, preocupadas em como chegar à massa.

Um dos problemas é que não temos certeza do comprometimento das forças reacionárias. O empresariado, a mídia, a Justiça, estão todos aceitando mesmo o fascismo? A OAB, Igreja, líderes que apoiaram o golpe, parecem sem vontade de reagir.

Existe um plano mundial traçado em algum Departamento de Estado?
Nossa divisão social absurda tirou da classe média progressista a compreensão da situação e da lógica desses eleitores pobres. Nem mesmo a cúpula do PT soube ler essa realidade.

Nossa classe média foi impedida de ter uma visão da realidade. Toda a comunicação passa por simplificação para fins comerciais e perseguição de inimigos. Depois de anos demonizando todo pensamento progressista, vejo os monopólios assustados com um fascista desgovernado no poder.

É muito triste ver como grupos de mídia participaram da construção do fascismo. Por exemplo, mesmo Haddad tendo criado mecanismos de controle da corrupção, preferiram agredir como inimigo político - como a loucura anticicliovia - e deu nisso. Vergonha mundial.

Nossa sociedade não aprendeu a ouvir o contraditório. Uma massa de pessoas sem a consciência do mundo contemporâneo, que engloba direitos humanos. É uma surpresa essa república, que era agora mesmo a 6ª economia do mundo, ser, na realidade, tão reacionária e incapaz de pensar. 

O que parece básico em uma democracia, o fato de os argumentos vencerem, é borrado por um pensamento único conservador e depois apagado por um marketing agressivo que, por exemplo, planta que "nazismo é comunismo" para evitar que vejam no que dá extremismo de direita. 

Ódio à corrupção, medo da violência, sensação de que os partidos traíram o povo, frustração direcionada para inimigos políticos, construção do inimigo contra quem "vale tudo" pelo sistema.

Um mundo em que manda o mais forte. A ideia de que a força bruta pode silenciar os fracos nos transforma numa república do irracional.

O que é muito perigoso é que as pessoas compartilham alucinações de "filósofos" anticomunistas (Olavão, o pai de todos) como se fossem totalmente incapazes de verificar os fatos.

Isso acaba em "tem que fuzilar os bandidos". A pessoa "pesquisa" nos sites mentirosos que confirmam sua tese.

Mesmo assim, lembro de Milan Kundera dizendo que o romance "1984" não é realista porque a realidade sempre tem janelas.

Na fila, uma menina negra ouve minha conversa com a caixa e fala: "Minha mãe votou no Haddad".

Se meus amigos progressistas me perguntassem o que fazer agora, eu diria: conhecer o pensamento conservador. "Devemos primeiro observar, escutar, enxergar a realidade e entendê-la, para depois combatê-la", diz a socióloga Esther Solano. Lembre de todas as vezes que você percebeu que estava errado.

Acho que o espaço é aquele da mudança com reflexão emocional: eu mesmo em certo momento achava correta a redução da maioridade penal, na onda de preconceito da mídia. Mudei.
É possível.

Afonso Lima


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