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segunda-feira, março 11, 2019

Totalitarismo, polícia política e justiça aristocrática

A supremacia branca autoritária pode ser civil ou militar. O povo é visto como inimigo.

Hannah Arendt diz que o núcleo oculto do totalitarismo é a polícia secreta.  O autoritarismo, evidentemente, como não é um governo baseado numa lei comum acordada, precisa de polícia política para controle e vigilância de dissidentes – e pode contar com apoio da aristocracia judicial.


Assim, também em uma sociedade marcada pela desigualdade profunda, teorias da desigualdade inata surgem para justificar punitivismo e segregação, que, disseminadas na massa, podem ser reforçadas por projetos legais populistas. Depois de tanto Datena, tudo que o pai de família quer é bandido na cadeia – e tomar o poder com o medo é fácil. (Ou com o medo da corrupção – campanha que já abriu espaço para governo privatizador e contra investimento público).

Temos uma longa história de perseguição política com instrumentos clandestinos do Estado. Parece que Kennedy tinha uma ideia fixa de que o comunismo se alastraria pelo mundo (o chamado “efeito dominó”, que ocultava o desejo de libertação dos povos) e, em 1961, pediu treinamento aos oficiais franceses para ensinar sobre a “guerra revolucionária”:

A “guerra moderna” ensinava o primado dos serviços de informação, o controle das populações civis, os interrogatórios “coercitivos” em centros clandestinos, o uso do “soro da verdade”, os desaparecimentos forçados de opositores, os esquadrões da morte, as execuções sumárias e a prática de jogar de um avião os “subversivos” ou “terroristas”. (Leneide Duarte-Plon, 2018)

Isso nos lembra que o general Heleno disse recentemente que a Igreja estaria com “agenda de esquerda” por defender a Amazônia, e parece que dez militares fizeram a espionagem. Ser contra o desmatamento e à favor dos indígenas seria “interferência em assunto interno do Brasil”.

Segundo o jornalista Lucas Figueiredo, no seu livro “Ministério do Silêncio” (2005), com o fim da ditadura em 1985, os trabalhadores passaram a realizar greves em defesa de melhores condições de trabalho e aumento salarial, pois a política de arrocho e a inflação, junto com a criminalização das greves, havia corroído seu padrão de vida. Para o Serviço Secreto (SNI), entretanto, mesmo diante do colapso iminente do bloco socialista, o mito do comunismo, com seus “inimigos internos”, prosseguia.

Quem quer acabar com a miséria é visto como “agente de forças estrangeiras”, e justiça social é sinônimo de anarquia.
Mesmo na democracia, a paranoia da conspiração para a revolução armada e “implementação do marxismo” justificava espionar principalmente PT e CUT.  O primeiro, com questões como a reforma agrária e a “estatização”, poderia ameaçar a “ordem político-constitucional”, assim como os anarquistas, com seus slogans nos muros, podiam contestar “os valores fundamentais da sociedade nacional”.

O antigo chefe do SNI, general Medeiros, criticando o Ministério do Trabalho do governo Sarney, que negocia as greves, afirma: “Cacete não é santo, mas faz milagre”. Torturadores em liberdade, terroristas de estado protegidos com impunidade.

O povo seria o inimigo da “nação”. É claro que essa teoria pressupõe uma “elite” capaz de saber melhor o que é bom para o povo. Toda a colônia precisa de uma instituição para preservar valores aristocráticos de hierarquia e uma lei que não crie problema à exploração.
Você pode pensar que a parcela autoritária do Exército, que se impôs, garantia os interesses capitalistas mais bárbaros contra a maioria explorada, além de ocupar cargos “gloriosos”, implementando o terrorismo de Estado por meio da ideia de segurança nacional.

Mas os agentes secretos se revestiam de heroísmo a la James Bond. Da mesma forma, os juízes-políticos podem ter sua missão purificadora, que mantêm o apartheid.
Se pensarmos em nossa história violenta, veremos que roubaram do negro sua casa, família e pátria e, depois de ser usado como objeto produtor para acumulação de capital, ele foi jogado na rua para o extermínio pela fome. Agora, vem o pacote de Sérgio Moro.

Lógica do Inimigo público – Lava Jato ou Serviço Nacional de Informações. O inimigo como forma de tomar o poder.
Semelhante ao Movimento Internacional Fascista Aristocrático de Steve Bannon, cujo livro de cabeceira (“The Fourth Turning, An American Prophecy”, publicado em 1997) afirma:

“O núcleo da Nação será mais importante que sua diversidade. Jogo em equipe e comportamento padrão serão as novas palavras de ordem. Qualquer pessoa ou coisa que não puder ser descrita nestes termos pode ser deixada de lado — ou pior. Não se isole das atividades comunitárias… Se você não quer ser mal avaliado, não aja de maneira a provocar a autoridade da Crise a te julgar culpado. Se você pertence a uma minoria étnica ou racial, prepare-se para uma reação nativista de uma maioria assertiva (e possivelmente autoritária)”.  

Hoje, uma crise de segurança abre espaço para o autoritarismo, que vai vigiar e punir os inimigos políticos.
O espírito messiânico dos “homens bons”,  pode vir pelo Exército ou pelos promotores e juízes. Os pobres/opositores podem ser “subversivos” ou “corruptos”, “bandidos”.  

Se o Serviço Secreto voltou, sua previsão de que a democracia acabaria logo deu certo, também parece que nosso ministro-juiz tenta legalizar o estado totalitário (antes paralelo) no Brasil.

“Abre-se mão do direito à presunção da inocência, o que levará ao cárcere inúmeras pessoas que não tiveram sua sentença definida. Segundo o Conselho Nacional de Justiça, no Brasil, 40% da população prisional é composta por presos provisórios, ou seja, cidadãos e cidadãs que seguem encarcerados sem julgamento definitivo. A medida proposta levará ao agravamento das condições já desumanas das prisões brasileiras, sucateadas e superlotadas”, afirma documento de 40 entidades do movimento negro à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), órgão autônomo da Organização dos Estados Americanos (OEA).

Afonso Lima

Figueiredo, L. “Ministério do Silêncio – A história do serviço secreto brasileiro de Washington Luís a Lula (1927-2005)”,  Editora Record, 2005.

Duarte-Plon, L.  “A tortura como arma de guerra-Da Argélia ao Brasil : Como os militares franceses exportaram os esquadrões da morte e o terrorismo de Estado”, Editora Civilização Brasileira, 2016.
Carta de Paris: Geisel : o documento da CIA, a história oficial e a verdade histórica - 14/05/2018  - https://www.cartamaior.com.br/?/Editoria/Cartas-do-Mundo/Carta-de-Paris-Geisel%A0-o-documento-da-CIA-a-historia-oficial-e-a-verdade-historica/45/40234

Política do “inimigo permanente” une Trump a Bolsonaro. Como o fascismo de Bannon usa o apocalipse para chegar ao poder
https://www.viomundo.com.br/blogdoazenha/politica-do-inimigo-permanente-une-trump-a-bolsonaro-como-o-fascismo-de-bannon-usa-o-apocalipse-para-chegar-ao-poder.html

Movimento negro denuncia pacote anticrime de Moro à OEA por violações
https://www.geledes.org.br/movimento-negro-denuncia-pacote-anticrime-de-moro-a-oea-por-violacoes/


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