Os fantasmas estão sobre as montanhas de ruínas. Chega o pássaro de penas vermelhas - penas que caíram uma vez na China e até hoje se canta uma canção sobre elas.
- Pássaro Vermelho, que conhece o empíreo e o trono de Deus, diga-nos como está a cidade do outro lado.
- Um milhão sob cerco. Logo, sem comida, combustível e água.
Uma mulher-fantasma chora, repetindo:
- Três mil anos antes do Jesus! Três mil anos antes do Jesus! Já se fazia comércio nessa cidade! Ha-lam! Ha-lam!
O fantasma envenenado a abraça.
O fantasma sem cabeça aponta a torre de onde foi ferido atrás da névoa:
- Eu percebi que iríamos morrer quando notei que não tínhamos remédios, fluidos intravenosos, antibióticos, medicamentos para dor, conjuntos de sutura e médicos.
- Ouvimos as pessoas nos túneis do inferno, só pequenas unidades - diz a mulher que escorre sangue.
- Quatro meses sem comida. Mergulhados no caos, e o regime permanecerá no poder - diz o Pássaro.
O fantasma sem um olho pergunta:
- É verdade que os que mais gastam em bombas também têm pessoas que têm fome?
O Pássaro abre as asas:
- Sim. Há muitos anos, meio milhão de pessoas morreram por causa de armamento químico no oriente. Agora, com essa desculpa, se começou o bombardeio.
O fantasma sem cabeça pergunta:
- Tudo isso é medo dos fundamentalistas? Eles foram treinados na Pérsia. Eu lembro quando o ouro negro foi nacionalizado há muito tempo na Pérsia e exércitos invasores tomaram o país. Os religiosos conservadores se rebelaram. Hospitais pegando fogo. Crianças mortas pelas ruas. Bombardear a cidade da Rota da Seda é o primeiro passo.
- Silêncio, diz o Pássaro Vermelho.
Uma fila de fantasmas chegam da cidade e o pássaro canta uma canção triste. Nenhum deles consegue conter as lágrimas.
Afonso Lima