Páginas

Ajude a manter esse blog

sexta-feira, dezembro 31, 2021

sexta-feira, dezembro 17, 2021

quinta-feira, dezembro 16, 2021

As Três Irmãs/ O jardim das cerejeiras - algumas impressões

Em curso com Elena Vassina, releio as peças.

As Três Irmãs é a obra sobre a passagem do tempo. Ou ainda a obra mais sobre a passagem do tempo.

Sua cor é o marrom da madeira das casas, o vermelho da lareira, a luz do crepúsculo. 

A peça é muito densa, paira sobre ela um determinismo talvez ligado à autocracia, ou à situação a mulher nesse ambiente, talvez ligado ao determinismo “biológico” num mundo onde a ciência era ainda pouco desenvolvida, uma sombra ameaçava constantemente a vida.

"Em primeiro lugar, estou enferno. E agora sei que muito enfermo. Mas não posso fazer nada", escreve Anton Tchekhov em carta. "É quase um ancião, tem as feições contraídas, parece doente", falou com despeito Lydia Avilova nas bodas do autor (Henri Troyat). 

Se diz que Schopenhauer era leitura de Tolstoi, que - pouco antes de escrever Ana Kariênina - sentia que sua vida "estava paralisada". Depois, sua cura será a fé e a obra social. (Mas o Círculo Chaikovski formava grupos de operários, e as brigadas vermelhas abalavam o governo de Alexandre II com "incêndios, roubos e assassinatos" - segundo Michael Knox Beran).

Aqui não apenas temos personagens que "perdem-se em reflexões", segundo o professor, marido de Macha - uns (Irina) são mais leves que outros (Macha). (Outros são de tal forma ridículos que não ajudam a amenizar o clima - Solionii e Tchebutikin são instrumentos desafinados).

As inovações de Tchekhov - como os elementos de atmosfera que cada personagem emite no seu leitmotiv - estão aqui muito claras. Esperando Moscou. No teatro pós-dramático, o tema do leitmotiv é muito comum, porque une os fragmentos na ausência de um enredo.

Não são diálogos, são blocos de sonhos. Parece que a fala se desencaixa do corpo - poder-se-ia encenar uma espécie de dança, cada personagem com seu movimento. Isso porque o corpo não está em ação, muito pouco interage com os outros, mas é suporte para a exploração de uma paisagem interior, de uma estrutura. Diz Irina: "Se não vou para Moscou... O que posso fazer?" Paradoxalmente, é ela que parece despertar do sonho muitas vezes os personagens para avançar a história... "Fico sozinha, sem nada para fazer, odeio o meu quarto".

Um tema pouco explorado é o do soldado frustrado com sua vida de pouca ação. Tempo perdido. Jogo como vício militar.

Tolstoi trabalha os militares heroicos; aqui os militares e sua família estão decadentes, vemos o machismo ridículo ("Eu mesmo lhe dou um tiro").

É difícil percebermos a comédia porque o autor tem muita empatia, nos identificamos com o sofrimento. É como se Tchekhov quisesse rir deles, mas acabasse amando-os.

Se, na Gaivota, fala-se do egocentrismo da intelligentsia - da ingenuidade da menina que se deixa seduzir pelo ouro falso, da vaidade - aqui é um ambiente "onde não se produz nada" - "historia idiota" - como o duelo.

O casal impossível Macha - Verchinin nos atrai desde o começo por representar um bom senso e delicadeza muito humanos. Por um lado, está o Tchekhov como analista implacável - o método científico, no mundo pós-romântico que pergunta como as coisas funcionam; por outro, o poeta, solidário com o sofrimento e a injustiça, o professor que percebe o moldar aristocrático da realidade para que não haja igualdade.

Se olhamos com a distância necessária, vemos o caso Macha - Verchinin  como reflexo da luxúria militar, homens solitários, muitos dos quais zombam do "filosofar" como o faz Solionii - em zonas militares e guerras, a situação da mulher é rebaixada, surgem prostíbulos. (As irmãs trabalham, mas é o homem que pode levar a família a reencontrar seu antigo status na sociedade).

Verchinin é o "major apaixonado"; o encanto da "nobreza militar" (pessoas "finas e educadas" para Macha) e o encanto que os letrados têm pra quebrar a solidão, frustração da zona militar (ouvir suas "lamúrias") - mas tudo dando em relação estéril - o ruído do fogão não nos deixa crer no amor sublime que parece existir.

O Jardim das Cerejeiras é a peça onde mais "nada acontece" - o que temos é um deslumbrante lirismo e o foco nas relações humanas, ou em cada universo pessoal. Sua cor é o branco das flores. Cada personagem tem sua filosofia de vida, nos mergulha na sua linguagem. A romântica aristocracia tinha um amor ao belo - o que falta à burguesia sem poesia - mas também era tola a ponto de "viajar à Paris" com o dinheiro enviado para comprar a casa. Cada um tem sua razão - não há forças para o embate dramático. 

Aqui, tudo é agitação. Temos um comerciante, jovens senhoritas, um contador, um criado malandro, um velho criado, um estudante, proprietários... Parece que Holbein usou uma técnica de "câmera clara" no seu quadro "Os Embaixadores", que era a colage de múltiplos reflexos espelhados para formar um todo. Seria uma tapeçaria de fragmentos da luz. Todos estão entrando e saindo, a comédia é mais visível. (Mesmo assim, muitas vezes prometem ir e nunca vão). Todos têm seu aspecto de ridículo.

Mas o século XX não parece poder ver aqui muito humor. "Quero viver ou dar um tiro na cabeça?" - diz Epikhodov. O peso do real ("Em agosto, a propriedade será leiloada") talvez soe, para quem já viu Hiroshima, muito além de uma "punição pelo riso".

Tchekhov, o mestre do amor universal, descreve em suas cartas com certa frieza irônica seus personagens: Irina é "uma criança, alegre do início ao fim"; Vária é "uma mulher limitada, de roupa preta, que parece uma freira chorona, etc..." 

Mas me parece que a forma correta de interpretá-las é justamente buscar esse outro lado - Liubov não como "criatura de moral duvidosa", que dá um dinheiro que não tem (o que aparece por si só se não for enfatizado), mas como uma pessoa comum, perdendo sua juventude, tentando lidar com sua perda, negando-se a aceitar o novo mundo "vulgar". A grande dama triste nos emociona por não aceitar cortar suas cerejeiras... Ela acolhe o "camponesinho" que chora. Tão humana e capaz de dizer: "E agora, como rareia seu cabelo..."

Há uma fala do estudante Trofimov que parece um ponto central, ainda que tudo em Tchekhov seja relativo, e nunca se possa encontrar a "moral" definitiva: aqui, ele diz, todos "filosofam e discursam sobre temas elevados" enquanto "os trabalhadores se alimentam como animais". Mesmo relativizado pelo ponto de vista de um estudante que quer “mudar o mundo”, a crítica é contundente. É perigoso amar a arte mais que a vida. Tchekhov vivia a época em que a colônia penal servia para explorar as minas de carvão - denunciou como o Estado servia a interesses privados. Enquanto a mística do Império falava no Pai de Todos, imagem de Deus. 

A peça é plena de luz e graça - névoa, flores e álamos. Uma orquestra inteira que faz poesia. A nobreza - mesmo com a hierarquia fixa da monarquia - parece ter uma diversidade de valores: hoje, a riqueza demonstra achar que a cultura atrapalha, é inútil. A ameaça do progresso, que pode ser pior; a cidade contemporânea é demolição e reconstrução - o ruído é nosso novo cantar de pássaros; o jardim das cerejeiras vendido num leilão é a verdadeira tragédia. Ainda mais para nós, que pedimos um pouco de beleza, enquanto a ambição semeia milhões de mortos.  

Acabamos amando cada um desses seres imperfeitos como amamos a natureza - também ela plena de luz e sombra. Obra-jardim, nos coloca num estado poético, como se víssemos o nascer do sol. “Oh meu belo jardim... Minha vida... minha juventude... Adeus. Adeus!”

Afonso Jr. Lima 


domingo, dezembro 12, 2021

VIDA

Rita Hayworth estava estreando seu novo filme. Rubens lançava sua novo game.  

Era quase Dia da Edição, quando você podia rever seu ano e ficar com os melhores momentos. Nessa festa, na qual cada casa tinha sua árvore de luz, era realizada uma cerimônia criando um avatar para um "real" capturado recentemente. O discurso do Presidente do Conselho contava do mundo horrível antes da duplicação.

As pessoas tinham no máximo 17 anos. Quando chegavam aos 18, O Ano de Despedida, a memória era atualizada, ficando apenas 30% do registro. Era o necessário para programar, vender e comprar. Pelo eixo dos olhos duplicados se sabia o desejo. O sequenciamento também era obrigatório para viver em VIDA. Foi o fim das cirurgias plásticas. 

O projeto VIDA começou como uma forma de evitar as moldagens negativas de ambientes corruptos. 
Dentro de VIDA, tudo era decidido pelo Conselho Técnico.

Era possível evitar cruzar com pessoas cujo perfil não era desejado. Alguns encontros eram evitados para que não surgissem filhos imperfeitos. Além dos militares que aprisionavam "reais", grupos fascistas os perseguiam e executavam.

O material genético do organismo estava recebendo uma informação nova: formou-se na Praça Central, de onde era transmitida a cerimônia para milhões de casas duplicadas, um rosto monstruoso, totalmente imprevisto e não selecionado. 

Imagens de um grupo de "reais" com o rosto borrado.
- Aquele seu amigo não voltou mais para o escritório virtual de VIDA? Sua ex-mulher desapareceu? Você nunca saberá porque eles foram apagados no mundo UM. Você está desconectado. O que eles estão fazendo é desaparecer com os DNAs que não se adaptam às suas expectativas. A meta é a perfeição. 

O monstro falou sobre o projeto de melhoria da humanidade pela empresa. 
Tentaram criar uma Atualização - houve uma queda do organismo. As memórias de décadas foram recuperadas. Gritos na cidade. Milhões de pessoas desorientadas recebendo luz do sol no rosto. 

*
Afonso Jr. Lima 




Live: Dramaturgas no Uruguai


 

domingo, dezembro 05, 2021

hoje você não

eu também desapareço

estava você 

e não

vieram os soldados

vieram as bombas

meu coração

tinha paredes de metal

que você fez

frágil fortaleza 

o mundo não é do grito

é das manhãs, que persistem

Afonso Jr. 

faça você verde

bicho tinha o rio

bebia o rio

água mãe 

bicho sabido subiu

ponte de vidro

pro céu fumaça

queimou rio

foice na face

bebe sujo bicho

lixo no fluxo

bicho contra bicho

bicho exportação

fome de bicho

roer o próprio osso

rio pesado

veneno na veia

laços de sangue

cantiga do rio de dentro

rio na veia

laço no próprio pescoço

água que corre

mata a sede

bicho mata bicho 

na corrente

ao vivo se acha o bicho

caule pouco vivo sozinho

se perde estéril estrada

água se vende

sempre tem outro bicho

tem pé memória 

contra a corrente luta a história 

alvorada na nova cidade?

outro monstro?

Afonso Jr 

sábado, dezembro 04, 2021

sexta-feira, novembro 26, 2021

Live: A tragédia grega


 

Godzi presidente

Godzi nasceu da radiação. 
A campanha falava no raio capaz de eliminar o mal. Godzi receberia um chip capaz de controlar seus instintos. Deus estaria do lado do monstro, afirmavam os teólogos. 

Ele foi colocado para falar na tribuna, ele recitou frases em latim. Eu sempre disse que ele não poderia ser presidente.

Havia muita gente nostálgica - ele representava um tempo onde tudo parecia ser mais fácil. 
Era uma velha história. Nos anos 1970, um Partido resgatou a ideia de Ordem e Pureza do início do século XX. Grupos extremistas entraram nas universidades e destruíram bibliotecas. 

Existiria um hálito radioativo capaz de purificar, limpar a sociedade. Godzi era capaz de se regenerar com facilidade. Mas na presidência, o hálito apenas serviu para incendiar florestas inteiras. Morreram muitos animais com ventos tóxicos - revoltando ativistas na Noruega. Veneno nas águas. 

Os supremacistas brancos mestiços eram seus maiores apoiadores. Performances de queima de bruxas com roupas da Cruzada. Godzi em viagens internacionais falando que precisamos fazer nosso país ser os Estados Unidos de novo. 

Em Godzi, o chip falhou. Tentaram colocar uma Mulher Medieval na vice-presidência. Alguns militares, experimentos do Império em época recente, viam uma grande conspiração global, tinham medo do comunismo, mas também de tudo que não havia na ditadura - da ecologia, das mulheres no poder, do Supremo Tribunal. O Exército ficou preocupado com a economia. O fim da escola pública civil ficou prejudicado. O caos na natureza desencadeou mortes aos milhares. 

O monstro tinha dor de cabeça. Tomava remédios. Godzi estava fazendo campanha para mais quatro anos. A resistência estava em cada esquina. 

*
Afonso Lima 


quarta-feira, novembro 24, 2021

Como fazer um Tchekhov

Como todo grande escritor Tchekhov é sempre atual. Portanto, depende do presente o "Tchekhov correto", pois o que causa máximo efeito no mundo de Stanislavski não será o mesmo no nosso mundo. Ao mesmo tempo, como médico, o escritor é o gênio da objetividade, deixa as respostas ao processo longo do leitor. 

Então, dialogando com o filme A Gaivota, dirigido por Michael Mayer, de 2018, gostaria de falar do Tchekhov "correto" - ou que me parece interessante. As primeiras frases da peça são já tão profundas que não poderiam ser de modo algum psicologizadas, porque não há como dizer "Estou de luto pela minha vida" de forma natural. (Professora Elena Vássina nos conta que é uma citação de Guy de Maupassant - de suas anotações em "Sobre a Água").

Então, parece-me que o caminho da expressão é o pior possível. É preciso aceitar a incomunicabilidade essencial desses personagens, personagens tão opacos e mutantes, pois é isso que dará margem à interpretação infinita. É preciso esquecer a vontade e os sentimentos. 

Essa é a peça de um contista; ela poderia ser apenas "monólogos da lua", descrições de paisagens do imaginário. Não precisa dessa ficção que se convencionou chamar "eu" (o hábito que Beckett vê desmontado por Proust). 

O filme traz um pouco de lágrimas. A lágrima é o drama, é conflito. É uma tentativa de prender Tchekhov no realismo inglês. Você chora quando sabe quem é, quando pensa que sofreu uma injustiça, ou quer alguém que se foi. Eles não sabem quem são. (Nina: "Mereço que me matem... Sou uma gaivota... Não, não é isto.") Ele não irá pintar uma rosa, mas perguntar-se o que é uma rosa - nesse sentido é modernista. Tal é o desafio de não entender, tão necessário. 

Para nós, é muito difícil imaginar o que significa a falta completa de esperança (talvez porque nosso sistema venda a esperança em cada frasco de desodorante). A sociedade de Tchekhov está parada, nada acontece, nada pode acontecer, volta sempre ao mesmo ponto (os servos estão livres e segue esse terror). A intelligentsia como um fruto (aparentemente) inútil na árvore do totalitarismo. Seus personagens não vão a lugar nenhum, a estrutura muda para não mudar. Nenhuma ação é possível. (É que o tempo da arte é muito longo). São peças sobre a frustração e o egoísmo.

Mas também sobre arte. Sobre o que deve ser o teatro. Até mesmo na Sibéria esses personagens assistem teatro (um teatro provavelmente feito de gestos herdados e poses exteriores). As projeções do autor - como dois escritores, como duas atrizes, como médico, etc. - são universos aos quais se deve descobrir, são objetos colocados para nossa análise científica. Nesse ponto lembra Rumo à Damasco. É o puro abstrato (como viu Meyerhold) e a máscara. 

Há, portanto, duas formas que parecem simplificar esses universos: uma é a exposição de sua superfície, outra é o aprofundamento dramático. 

Já vi atrizes gritando como se pudessem entregar uma mulher vaidosa expondo sua vaidade. Parece-me que é justamento o oposto. A face oculta da lua fará com que se veja o todo. É preciso ver Treplev não apenas como um garoto mimado e romântico, mas como (a máscara de) um jovem maduro e seco, em quem o público deve se ver. Da mesma forma, Trigorin é menos interessante como um apaixonado tolo, do que como um vaidoso incapaz de ver os outros. Arkadina é pior como mãe e atriz atormentada do que como A Arte, brilhante e fria, capaz de viver de e para si mesma.

A superfície do mar é agitada, mas o fundo se move devagar. Porque esses personagens não são apenas indivíduos que têm sentimentos - a máscara - mas são sentimentos. E como se interpreta um sentimento? A única forma de interpretar um sentimento é "executando-o", como a única forma de interpretar uma melodia o é; é preciso assumir que são filhos do darwinismo, perderam todas as referências que a tradição lhes dera, interpretá-los como se fossem mesmo maquinas.

A outra forma é dar um sentido à tudo. É claro que, dadas as expectativas que o cinema cria, de que haja "pessoas reais", de que haja conflitos como os nossos..., qualquer filme vai sofrer muito para poder nos deixar no estado de suspensão que o texto propõe. Não são textos que nos dizem que a vida não vale a pena - já que o autor parecia ter uma vida cheia de entretenimentos e amizades - mas que perguntam sempre pelo sentido, pelo sentido depois de tantas descobertas, e criam um espaço no tempo para que nós tenhamos esse vácuo. 

O mundo é como esse lago, inconstante e fugaz (a palavra "lago" aparece vinte vezes no texto). Dostoiévski vai mudar nossa vida, mas também nos deixar num estado de tensão talvez incompatível com a dura banalidade do cotidiano. Dostoiévski percebeu Auschwitz, mas Tchekhov percebeu a fila de banco. Essa é a comédia. Tchekhov está mais próximo de Beckett - sua resposta é a ironia. 

*

Afonso Junior 



domingo, novembro 21, 2021

Adam and Eve

(This is a rush translation. Copy may not be in its final form.)

The planet has always had this specificity: its humans changed their bodies every day. The penis became a receptive organ, the clitoris grew and became a penis. That's why the adopted gender was fluid, which avoided convulsions.

In the Senate, the conservative group - led by W. Fox, had gotten a bill passed to authorize "chemical castration," a pill that was supposed to define biological sex for an entire year. After a period of rest, the individual could decide which body to adopt.

The senator had enlisted the support of large companies with the idea that this would increase productivity; moreover, "women" could earn less.

Lucas K. was a 17-year-old cybertheorist who had accumulated all the information about the neo-reformers and started a pacifist movement to "conserve the mutation."

sHe was arrested after members of the group - the so-called Anonymous circle - were held responsible for terrorist attacks on reforming temples.

W. Fox went on TV accusing Luc K. of being part of "the totalitarian left that wants to prevent progress".

The project was finally approved. An advertising campaign was created to achieve 70% approval.

The newspapers denounced the "double sex hysterics".

In the elections, W. Fox was proclaimed president.

The project has become an essential part of the public health agenda. Each day, more obligatory gender characteristics were established: weakness, strength, interiority, exteriority.

Many poor "women" now have to take a test in order to study.

Others were considered subversive and admitted to work hospitals.

"Men" were also being militarized.

But the terrorists have not stopped. In fact, they were financed by liberals concerned about growing inequality. Surveys indicate that there has been a radicalization of certain sectors, we imagine that things have gotten out of hand. A biological bomb exploded on the moon, contaminating the Earth so as to kill virtually the entire population.

When it all started again, there was only what was called Adam and Eve.

*

Afonso Jr. Ferriera de Lima 

Other materials - English version

https://afonsojunior.blogspot.com/search/label/English%20version

Adão e Eva

O planeta sempre teve essa especificidade de que seus humanos trocassem de corpo a cada dia. O pênis se tornava um órgão receptivo, o clitóris crescia e se tornava um pênis. Por isso o gênero adotado era fluido, o que evitava convulsões. 

No Senado, o grupo conservador - liderado por W. Fox, conseguira a votação de uma lei para autorizar a "castração química", uma pílula que deveria definir o sexo biológico por um ano inteiro. Depois de um período de descanso, o sujeito poderia decidir que corpo adotaria. 

Oa senadaor havia conseguido o apoio de grandes empresas com a ideia de que isso aumentaria a produtividade; além disso, as "mulheres" poderiam ganhar menos. 

Luc K. era um cyber-teóricao de 17 anos que acumulara toda a informação sobe os neoreformadores e iniciara um movimento pacifista para "conservar a mutação". 

ElaE foi preso depois que membros do grupo - o chamado círculo Anônimo - foi responsabilizadao por ataques terroristas a templos reformadores. 

W. Fox foi à TV acusando Luc K. de ser parte "da esquerda totalitária que quer evitar o progresso".

O projeto foi, por fim, aprovado. Uma campanha de publicidade foi criada para atingir 70% de aprovação. 

Os jornais denunciaram as "histéricas do duplo sexo". 

Nas eleições, W. Fox foi proclamado presidente. 

O projeto se tornou parte essencial da agenda de saúde pública. Cada dia se estabeleciam mais características obrigatórias de gênero: fraqueza, força, interioridade exterioridade. 

Muitas "mulheres" pobres passaram a ter de realizar uma prova para poder estudar. 

Outras, foram consideradas subversivas e internadas em hospitais de trabalho. 

Os "homens" também foram sendo militarizados. 

Mas os terroristas não pararam. Na realidade, foram financiados por liberais preocupados com a crescente desigualdade. As pesquisas indicam que houve radicalização de certos setores, imaginamos que as coisas tenham saído de controle. Uma bomba biológica explodiu na lua, contaminando a Terra, de modo a matar praticamente toda a população. 

Quando tudo começou de novo, havia só o que se chamou Adão e Eva. 

*

Afonso Lima 

quarta-feira, novembro 17, 2021

A guerra da casa

Quando eles criaram a casa, quiseram colocar azulejos da cor do sol e do outono nas paredes e nos muros, de modo que o jardim se enchesse de cores quando refletido neles. 

O Dono e a Dona (e Crianças) eram muito orgulhosos de sua conquista e convidaram uns Amigos para comer carne.

O Amigo e a Amiga e a Amiga dos Amigos decidiram não sair. O Dono ficou com sua família na parte Norte da Casa e todo dia atirava de sua janela na parte Sul onde viviam os Amigos. Ali, havia dois revólveres e munição do tempo da Colônia, se camuflavam no jardim cada dia mais cinzento. Quando suas balas acabaram, tiveram de esconder-se, os donos ganhavam território. 

No começo, Dono passava horas no carro na porta da casa, fazendo mira, esperando. A Dona quebrou toda a louça branca que tinha para dificultar a movimentação dos Amigos. A louça foi aderindo aos azulejos que foram ficando invernais. 

Por fim os Amigos foram absorvidos pelas paredes pelas quais se esgueiravam, e Dono e a Dona (e Crianças) já não dormiam para tentar ouvir passos. 

Essas Crianças cresceram com o hábito de circular pela casa armados como seu pai, e o frio da louça que pisaram toda a sua vida lhes mudou a biologia. Procriaram. Depois de uma vida sem glórias, desfizeram-se em pó.

Os netos, as Novas Crianças, decidiram reformar a casa. Pintaram os azulejos, mas tudo que conseguiam foi um clima de pastel estúdio. Decidiram fazer um programa de televisão. 

A cidade toda passou a assistir a transmissão de sua vida. Nada acontecia de verdade, de modo que o coração de toda a cidade foi parando, num efeito similar à hipnose. Mas iam regularmente abastecer suas necessidades de supermercado. 

Assim que a cidade foi rapidamente emudecendo. Apenas um ruído contínuo gelava o espírito de algum pássaro perdido. O que mais chamava a atenção de quem, por engano, cruzava por ali era o estranho silêncio de seus habitantes, e a forma como tudo parecia na verdade ter absorvido o branco gélido da louça nas paredes. 

Afonso Junior F. Lima 



terça-feira, novembro 16, 2021

Vivir a la intemperie - crítica

Vivir a la intemperie -
Montevidéu - 14 de novembro de 2021


"O que vamos assistir?", me perguntam.

Livre-associação, respondo.

Vivemos o cruzamento das artes visuais, dramáticas e da performance.

Já não é apenas um "acontecer", ou um corpo em risco como foi nos anos 1970.

Nos assusta a ideia de que todas as vivências podem ser clonadas e recompostas em produtos cult.


Podermos associar livremente é muito no mundo onde tudo tem de ser transformado em produtividade (lucro), portanto, no qual o desejo é planejado, no país onde a aristocracia rural quer converter à todos em escravos de novo - como toda a direita, abandonando o sentido (Jorge Alemán) em nome de um delírio persecutório que mobiliza a pobreza intelectual plantada pelo neoliberalismo.

Esse trabalho foi realizado no Espacio de Arte Contemporáneo - "antigua cárcel de Miguelete (1889-1986)". O "control omnipresente" do sistema arquitetônico panóptico pode parecer muito com a jaula invisível que sufoca a cada dia o não planejável e o novo.

A "primeira cena" que vemos nos remete mais a uma instalação - dois atuantes no solo, um em pé projetando uma grande sombra na parede, outro muito atrás projetando uma sombra pequena. É como um umbral no qual entramos.

Aqui domina a música e o medo. O tempo se deforma. 

A pessoa que me recebeu falara em mover-se em busca de uma melhor perspectiva. O público deveria circular pela instalação, mas de modo geral, fica em pé nas paredes.

A imobilidade me remete a repressão que criava um lugar absoluto a cada sujeito, mas também a nossa própria situação quando um vírus mortal nos isolou.

Começam movimentos que me remetem à poética do fracasso de Samuel Beckett - que tanto inspirou os artistas plásticos e performers.

Um esforço sempre cômico. A repetição quando a própria paisagem parece desértica. 

Lembremos de Bruce Nauman (1941) lendo Samuel Beckett (1906-1989). 

Repetindo tarefas banais, o artista queria dilatar o tempo: "um corpo que se lança em atividades insólitas e que nelas e com elas perde tempo" (Liliane Benetti - Bruce Nauman, Samuel Beckett, O despovoador - USP - Literatura e Sociedade, n. 55)

A outra estruturação ocorre quando os atuantes entram para baixo da lona que cobria o chão e criam "montanhas" dançantes.

São uma versão sombria dos parangolés, do artista brasileiro Hélio Oiticica. Os corpos vão buscar algo, descobrem o desejo.

Uma atuante dança na sombra - seus estranhos movimentos são quase invisíveis. Um fantasma. Está "desaparecida"? Está surgindo lentamente?

Uma dança de espelhos cobre de azul os edifícios. A luz fere, mas também transfigura.

Porém o modernismo, com sua poética de ruína, é passado: já emergem linguagens que desnorteiam 
as nervuras da mentalidade hetero-patriarcolonial.

Agora tudo é ruínas e sacos de lixo pretos.

As plantas aparecem, plantas em contrastes com esses corpos que já nos parecem cansados e cheios de história. É como se os jovens quisessem libertar-se desse passado sem negá-lo.

Eu sabia o tempo que ia durar a obra. Saí cedo: o público ficou ainda, penso que querem habitar esse novo espaço insurgente.

Já passou o tempo do novo. Resta um tempo no qual estejamos presentes.

Uma das integrantes, depois, me conta que a ideia de ausência de centro estava presente na elaboração, por exemplo, ausência de uma temática clara ou de um centro narrativo. Mas é impossível não pensar na ausência de corpos e desejos na ditadura.

Nesse sentido, é um pouco necessário mostrar que nem tudo está achado.

O grupo cita Gertrude Stein: "tudo que não é uma história pode ser uma peça".


Afonso Junior Ferreira de Lima

*

sábado, novembro 13, 2021

sábado, novembro 06, 2021

terça-feira, novembro 02, 2021

quarta-feira, outubro 13, 2021

Após você

O que fica

a lágrima e a voz

a pele rezando a lua

- a vida segue 

dança e chuva, ouro e feriado

o carnaval pai do teatro

- a vida aprende

a folha verde que vence 

espelho e loucura - sem ira 

- tudo muda

os livros de primavera

minha mão na tua 

- obrigado 

é o que fica

Afonso Jr


sábado, outubro 02, 2021

quinta-feira, setembro 30, 2021

sábado, setembro 18, 2021

sexta-feira, setembro 17, 2021

sábado, setembro 11, 2021

sábado, agosto 28, 2021

sexta-feira, agosto 27, 2021

sábado, agosto 21, 2021

domingo, agosto 01, 2021

Escravocratas de mármore e o futuro da paz

"Sim, as estátuas de Gaio Calígula foram derrubadas e desfiguradas, mas isso conferiu algum benefício a Roma? Tornamo-nos menos brutais e mais justos? Podeis pôr abaixo estátuas, mas não podeis eliminar vosso passado. A única coisa que podeis em relação ao passado é com ele aprender." 
(https://aldodinucci.blogspot.com/)

"Fatia do 1% mais rico no Brasil tem 50% de toda riqueza do país". (Bloomberg. 22/06/2021)


A paz necessita da prosperidade mínima geral. A verdadeira harmonia tem relação com a justiça. Queimar em nome do bem nunca é legal, mas civilização é prevenção. Que canais nós criamos para aceitar e refletir a discordância? Qual a pré-história do fogo? Que fazer para evitar que uma parte se sinta agredida pela agressão ao agressor?

Antes de mais nada, é preciso lembrar que tudo que está consolidado foi criado, que há escolhas e planos em tudo que nós herdamos. Quando não há decisões coletivas e debate público, o que há é a imposição dos valores dos poderosos de ontem. O cidadão universitário branco pouco informado se vê na imagem do caçador de gente. A estátua é o apagamento da caça, da dor que a história esconde. 

Óbvio que, politicamente, é sempre mais fácil colher os louros da ignorância e embarcar no senso comum. 

Paulo César Garcez Marins, professor do Museu Paulista da Universidade de São Paulo (USP) - "Os sertanistas, vistos como bárbaros por grande parte dos membros do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, sediado no Rio de Janeiro, e por artistas cariocas, foram progressivamente enaltecidos nos círculos literários e intelectuais paulistas como líderes do processo de construção territorial do Brasil". (BBC)

Nenhuma sociedade deseja a guerra. É preciso ver além do medo, como um sintoma social, e perguntar que impediu o debate. Porque vemos muito o "discurso do monumento", que lembra muito o discurso de que "protestos atrapalham o trânsito", ou mesmo aquilo que se dizia há poucos anos sobre ser impossível fechar a Avenida Paulista aos domingos por questões de "saúde pública", dado o número de hospitais na região (era apenas para a classe média poder circular de carro). Como não haverá fogo se as vias de representações políticas e a comunicação - mesmo antes da ascensão do fascismo de Estado - parecem totalmente controladas? 

Também não precisamos de gente nos dizendo que o bandeirante em questão não era tão mau (mais do mesmo: livros servindo de narcótico, vide eugenia belle époque em jornais e universidades). Não se trata de uma figura em si, mas do que esse grupo representa. Representa o uso da terra e a objetificação dos povos originários por sertanistas dispostos a tudo. Significa a dissolução de disputas tribais endogâmicas por um massacre baseado em hierarquias de raça. "Chega de louvarmos assassinos do povo" é a mensagem. A sociedade brasileira mudou: mais pessoas têm acesso à livros, universidades e debates que circulam no mundo. 

Dr Shawn Sobers, University of the West of England - "At the same time, the anti-racist movement isn't about statues. It's trying to eradicate racism from society and bring equality where there's racial disparity which cuts across economic divides... But statues are a symbol of how seriously our cities in Britain are actually taking these issues." (BBC)

Prefeita Nikuyah Walker - “ Derrubar a estátua é um pequeno passo em direção ao objetivo de ajudar Charlottesville, na Virgínia e nos Estados Unidos, a lutar contra o pecado de estar disposto a destruir os negros para obter ganhos econômicos”. (Democracy Now!)

Suzane Jardim, historiadora - “A memória negra foi varrida, como a memória indígena foi varrida e ninguém questionou (...) A gente sabe que não tem uma estátua de Zeferina do Quilombo do Urubu, por exemplo.” (Brasil de Fato )

Por que a República não conseguiu revisar nossos valores - por que ainda pensamos como nos anos 1970? Existe todo um trabalho de identificação com a nobreza promovido pelos meios de comunicação. A dor e o sofrimento do homem branco rico são exaltados até que toda a classe média se desfaça em prantos. São nossos líderes, não podem ser criticados. A imagem do fogo é disseminada como pânico. Criamos uma sociedade disposta a perdoar tudo, a paz como violência. O uso do medo como fator de silenciamento. O resultado de uma opressão contínua sempre é o pior. 

Quem defende esses "heróis da pátria" não sabe quem são - ou, pior, acha que a eugenia é natural. O espanto nasce numa auto-percepção como continuador de nobres empreendedores? A narrativa histórica é sempre viva, é sempre posição política. No seu melhor momento, é a revelação de uma realidade sufocada, a correção de uma mitologia opressora, a complexa rede de contradições no lugar de uma serena falsidade. Esse monumento não poderia estar aí porque o que ele está dizendo é que a república é dos opressores. É a mesma lógica que impede que tenhamos ruas com nomes de nazistas - seus valores dividem a sociedade entre pessoas dignas e objetos descartáveis, e não podem ser tolerados. Precisamos falar do monopólio do discurso e do ódio racial que foi naturalizado em nossas estruturas. 

Precisamos pensar como um governador diz, como Geraldo Alckmin (PSDB), que projetos de sociologia seriam “pesquisa inútil”. E como pode ter falado em “máfia das universidades sugando dinheiro público”.

Porque pouco tem sido feito para impedir que o trabalhador sem escolaridade seja alvo do pânico. O projeto de destruição da universidade é um plano para acabar com a reflexão pública e o confronto de argumentos, o que sustenta a república, porque assim fica mais fácil a massa perseguir opositores e votar contra os imigrantes:

"Atualmente fixadas na mira estão as disciplinas de humanidades - artes, línguas e ciências sociais - que sofreram cortes drásticos de financiamento e foram ignoradas por um governo empenhado em promover o que é moderno e gerador de receitas (ciência, tecnologia, engenharia, matemática)." (The Guardian)

A estátua sofre porque as opressões continuam. A discussão não é "quem foi ele" (apenas), mas quem somos nós. O que aceitamos que é o país. Um fascista é alguém incapaz de mudar. Por que nossos governantes ainda se enxergam em assassinos de não-brancos? Por que os eleitos escolhem o racismo colonial e não o efetivar da Constituição? 

O fundamental é termos espaços nos quais as discussões possam ocorrer: não apenas através de "representantes" alimentados por caras campanhas, não apenas com o acionar da Justiça. 

Que o Parque seja marcado por bárbaros é uma sinalização para que o cidadão se veja como parte de um povo glorioso que superou outros povos? Sou à favor de criar o museu das velharias eugenistas. Vamos mudar nosso passado, porque mudamos quando entendemos. Há sempre o perigo do libertador de hoje ser o tirano de amanhã claro. Agora, a rebelião nasce do esquecimento. 

Da incompreensão do nosso erro. Se tivermos sorte, não será olho por olho, não será destruição, mas contextualização, abertura a novos mundos, acordo entre iguais. A forma de acabar com a violência é aceitar a verdade do outro, e só isso pode romper o ciclo de nossa sociedade erguida em sangue. 

Ajr

https://www.bbc.com/news/uk-england-bristol-57350650

https://www.bbc.com/portuguese/brasil-53116270

https://www.democracynow.org/2021/7/12/headlines/charlottesville_virginia_removes_racist_statues_after_protracted_legal_battle

https://www.brasildefato.com.br/2020/06/15/o-que-significa-retirar-estatuas-de-escravocratas-do-espaco-publico

https://www.theguardian.com/education/2015/mar/29/war-against-humanities-at-britains-universities


sábado, julho 17, 2021

quinta-feira, junho 24, 2021

Laboratório flamenco

sou o vazio

por não saber posso

colecionar quatro lados

suspensão dos juízos 

sólidos isolamento 

e meditação decompor 

as estruturas mística 

do concreto vaso 

de imagens poética 

das moléculas teologia 

negativa buscando o vazio

uma torre oceano 

uma folha vermelha

o ouro e o fogo 

dança que dele nasce 

um caminho de laboratório

não saber como método

coerência imperfeita

o pensar das plantas

aceito a lei divina 

Têmis sigo o código 

filhos da natureza

não sou do mundo

sou o vazio

sou mundo e saem do forno

espíritos bruma luminosa

o novo ouro 

futuro 

*

Afonso Jr Lima 

terça-feira, junho 22, 2021

Alexandre Boer - in memorian

Não é fácil entrar na casa de um gaúcho. De uma palestra, passamos a ser amigos, eu não estava sozinho.

O gaúcho tem fama de ser desconfiado, até mesmo arrogante e inflexível. Então, para qualquer jovem, tentando encontrar seu caminho, é importante esta figura de referência, que, sem segundas intenções, sabe acolher e está disposto a construir junto. Assim era Alexandre Boer.

Podemos dizer que fez parte dessa geração que construiu um espaço democrático, que forçou o país a ter leis e limites, que teve coragem de crer que era possível participação e igualdade. 

Incansável, esteve presente em seu tempo quando a epidemia de AIDS afastou uns dos outros; quando (me mostrava nas fotos) se ia com roupas espaciais recolher os falecidos por puro pânico. O grupo Somos (éramos cinco numa sala) agora pode ser visto como um lugar de acolhimento para os jovens gays que vivem sob a opressão atual. 

Também fez alguns jantares na sua casa nos quais ele, eu e seu marido Cléber, debatíamos política, ativismo, relacionamentos e cachorros. Compartilhamos ideias progressistas, confirmamos suspeitas e insatisfações. Somente com pessoas inteligentes podemos ter esse prazer, essa riqueza, com pessoas sem ilusões banais, com pessoas que afirmam a verdade com decisão. 

Numa praça, respondi a suas pesquisas. Num encontro, numa roda, falei de minha experiência para orientar políticas públicas. Fomos juntos a palestras sobre Direito da Família. Cheio de energia, cheio de alegria, sempre com argumentos perspicázes. 

Lá estava eu quando ele fundou a "ala gay do PT", pego de surpresa, recebendo os Tarsos e Olívios enquanto ele preparava as mesas. 

Anos depois, quando tive uma discussão num relacionamento, sai pela rua em direção... à sua casa. Com ele descobri livros e autores. Havia um universo no qual eu cabia, assim como eu era, havia uma história na qual eu cabia. Havia que estudar. Eu valia a pena. As pessoas valem a pena. Ele dizia que eu era uma "fonte de infinitas ideias".

Não deve ter sido fácil para Alexandre ver a cidade de Porto Alegre abandonada como está; para mim não foi. Mas assim são as ondas da história. Cada geração aprenderá com suas dores. Uma das coisas mais bonitas é ver que o Somos continua, que novas pessoas levam sua bandeira porque puderam deixar ali sua marca. 

Acima de tudo, Alexandre era uma pessoa interessada em planificar a mudança. Mas a política é feita de afeto também, de confiança, de generosidade. Ele sabia o que era preciso fazer, ele tratava de buscar aliados. 

Assim são os homens públicos, e este foi um homem público. Graças a eles, a comunidade prospera, e temos de semear sua memória para que um novo dia nasça. 

Afonso Junio Lima 








domingo, junho 20, 2021

O arauto

O juiz peixe-com pernas de homem apontou para a cidade. O padre com asas de inseto abençoou o arauto. 

Um meteoro atingiu a Terra. 

No cemitério, o arauto tocou sua harpa milagrosa. 

Os mortos saíram da terra. 

O exército foi acionado: fumaça cobrindo o horizonte. 

O arauto tocou seu tamboril em frente ao mar. 

O horizonte escureceu, ventos, fuga, uma onda de dez metros destruiu todas as casas. 

O arauto subiu na torre mais alta. Tocou sua flauta. 

O oxigênio da atmosfera se tornou venenoso por três minutos. Pessoas sufocaram na avenida. 

O arauto subiu até ver os continentes ao longe. 

Crianças nos seus berços tiveram pesadelos com fogo nas cidades e demônios-animais que cantavam. 

O arauto abriu o portal dourado. 

*

Afonso Lima


terça-feira, maio 18, 2021

A ameaça

na jaula do teu povo

os teus não sobraram

queima das oliveiras 

exército de comunicação 

sua irmã o viu crescer

horário de entrada na cidade

a escravidão desejada

humilhação da mãe

para prender o pai 

sua irmã sob as pedras

voa do edifício

os teus não sobraram

*

AJR


segunda-feira, maio 17, 2021

A lei dos animais

Tendo chegado de outro lugar, ele não tinha papéis. Seus papéis não eram válidos. 

Agora sabia o que significava ser um animal. 

Animais não podem alugar imóveis, dizia o manual recebido no desembarque. 

As contas de banco estão vetadas a animais. E demais operações com cartão. 

(Para segurança de todos que buscam ganho automático e sem perturbações).

As profissões não serão acessíveis a animais. Não poderá ser chamado "profissional".

(Tinha duas patas, afinal, tinha dentes, sabia cantar: o que o diferenciava de tantos outros domesticados?)

Animais não podem acessar o sistema de saúde. (Ou podem, mas nunca saberão como fazê-lo). 

Animais não têm linguagem. Seus ruídos não são um sistema. 

Animais não estão proibidos de falar em política. Mas, o silêncio evita o juízo. 

Não se recomenda casamentos entre espécies diferentes. 

Apesar disso, animais são bem-vindos e podem trabalhar.

Em caso de parada pela polícia, use a expressão "senhor". As sirenes de polícia sempre procuram animais. 

*

Afonso Jr Lima



sexta-feira, maio 14, 2021

domingo, maio 09, 2021

J. Estripador

 A rainha pisa o tapete dourado colocado no chão da Zona Leste - usa uma capa negra, véu e apenas quatro seguranças para disfarçar-se. 

- Mas o que essas mulheres faziam na rua essa hora?

- Elas estavam trabalhando, majestade - falou o chefe da polícia. 

- Alguma relação com irlandeses ou judeus?

- Não sabemos. Não sabemos nada. Só sabemos que temos inúmeros bordéis e marinheiros.

O duque resolve interromper:

- Majestade, acho que já é o suficiente. 

- Não perguntei sua opinião, Duque Albany. É verdade que receberam cartas?

- Sim. Assina J. Estripador. Achamos que pode ser um açougueiro, médico ou marinheiro que transporta carnes. 

- Que ridículo. Por que um açougueiro mataria cortesãs? 

- Encontramos um avental sujo de sangue e um grafite: "Os Juwes são os homens que querem não ser culpado por nada". 

- Quero o general Jackson no meu gabinete. 

Os homens pareciam nervosos. Ela havia dito que não ia mais permitir ser excluída assim, pois isso lhe impedia de defender o bem comum e "expandir o Império". 

- Fale, doutor. 

O cirurgião policial Thomas Bond respondeu:

- Um homem de hábitos solitários, condição mental vingativa ou taciturna, mania religiosa.

- General Jackson, o senhor sabe que temos um homem assim. Um homem que o senhor promoveu recentemente justamente por ter sangue frio. Fomos criados para achar que essas pessoas são animais. Nossa polícia foi treinada para controlar estrangeiros e miseráveis. Algum deles devem ter saído do controle. Esse bairro deve melhorar. Vamos ocultar os resultados e promover a educação das mulheres. 

Os senhores saíram do gabinete de cabeça baixa. 

Afonso Jr. Lima 

sábado, maio 08, 2021

quinta-feira, maio 06, 2021

viva a pátria

à Fernando Cabrera

*

a última vez em que amou

o beijo no único

em morte pura máquina na rua 


o espelho e amor de sofia

desde outra vida o fundador 

canibal verso inaugural 


do império vem rainha

nunca se cala pisa devagar

eu te chamo dona da canção


a montanha que se sobe 

em rendas de lua e pura altura

a solidão da sombra cecília 


senhor do tempo heroi 

tratado de demolição 

roubando rosas rasgando a pátria 


não segundo a prosa oficial

a duplicação da língua

minha ilha solta e a verdade


gata no teto carne fúria

espuma na boca e faca

da lama sereia a voz 


olhar fúnebre de vertigens 

o morcego observa a cama

pantera em mão sombria 


careta limpo não viu

o profeta vermelha boca 

ia chuva desesperada 


os pés de menino

fantasmas amigos

a casa vazia risos 


procissão das raças 

no latim o quanta e o alho

flor de marfim e mel 


pequeno deus esse medo

esses rostos nosso livro língua

a metafísica da primavera 


passos na calçada desarmar

a criatura sal e ânsia 

o destino de uma brotação 


dentro da casca aquele som

areia violão você entardece

o caminho das águas a noite 


uma só vista

ilumina desde dentro

na minha língua

tudo se compartilha

 

*

Afonso Lima





sábado, maio 01, 2021

Live: Harold Pinter - Arte, Verdade e Política


 

Beckett, Pinter, Foucault - aproximações na paisagem do desmoronamento do eu

II Colóquio Samuel Beckett do GP Estudos sobre Samuel Beckett

Agosto - 2017 
[10:00 – 12:30] MESA 5: Página e palco


- Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin
USP - Cidade Universitária - São Paulo, SP


sexta-feira, abril 30, 2021

El castillo (ESP)

Siempre me gustó el campo. 

Ese juego de viento, sentir la hierba húmeda, pelota con el perro. No siempre igual.

Todo era tan diferente de mi noche oscura y fría. 

Empecé a pensar que me faltaba una compañía.

Sí, la hija de la criada, yo mismo creé esta situación. 

Podría haber atraído la mayor, pero la más pequeña era más risueña, más dócil, le gustaba más correr con el perro. 

No es fácil vivir así, o sol e o verde me revivem, este viaje sin fin, la angustia del trabajo técnico, mi camino solitario por el vacío. 

Ella se estaba volviendo cada vez más infantil mientras jugaba en el campo. 

Yo, cada día más paternal, protector, más cercano a la protección y al placer. 

Y cómo sonreí jugando a la pelota. 

Tenía una forma de girar la cabeza un poco rápida, un gesto de insecto, un gesto de juguete. 

Mi soledad era un abismo. Soy embarcación sin vento.

Estaba en un sueño, el castillo estaba muy lejos, por fin quise convertir el abrazo en un beso y el beso... 

Fue entonces cuando la máquina se detuvo. Esa noche no pude dormir, mientras la nave atravesaba el espacio oscuro.

*

AJR

quinta-feira, abril 22, 2021

segunda-feira, abril 19, 2021

Um assassino em série

O primeiro caso ocorreu numa rua mal iluminada, era uma garota de 14 anos que chegava da escola. 

A polícia trabalhou com a hipótese de estupro seguido de morte, era um bairro no qual o desemprego era grande. 

Um mês depois uma mulher foi encontrada morta num parque ao lado de um hospital. A imprensa passou a cobrir o caso, tratava-se de uma professora. 

Os policiais tinham várias linhas de investigação - tentavam criar uma personalidade para o assassino, tentavam criar algum nexo entre as vítimas.

Um homem foi assassinado em seu apartamento num bairro nobre da cidade - as mesmas características, o mesmo golpe, as marcas de violência no pescoço. 

Surgiram múltiplas denúncias de ataques semelhantes - mas a polícia trabalhava com a hipótese de um assassino em série com compulsão sexual, ia eliminando as informações indesejáveis. 

Passaram a fazer reuniões todas as manhãs, cada dia surgiam mais e mais teorias, suspeitos, interrogatórios, arquivos. 

Um policial entrou na sala de reunião cortando a fala do inspetor-chefe:

- Mais dois casos, senhor! 

Logo, estavam surgindo dez casos por dia. 

Havia muito trabalho, mas caminhavam num pântano de discussões.   

O prefeito passou a fazer reuniões todas as manhãs, logo, o governador, logo, a presidenta. 

- É invisível? É um serial killer ou um fantasma? - ela dizia observando as centenas de pontos no mapa da cidade. 

Novas áreas foram redirecionadas para o trabalho noturno dos coveiros. 

Em um ano, mais de três mil pessoas estavam morrendo por dia. 

*

Afonso Jr Lima. 

terça-feira, abril 06, 2021

A queda do tirano

Meu amigo recebeu hoje seus implantes auriculares. 

O sinal é emitindo no tímpano e a orelha é envolvida para não haver perda.

O que faz com que a única comunicação seja através da voz interna.

Haviam proibido conjugar os verbos no passado. 

- Um cão da raça pura podia matar um cão da raça impura sem que o dono pudesse fazer nada. 

São pessoas que só conseguem trabalhar e relaxar. 

Tudo isso para receber programação exclusiva. E uma Tela Humana. 

Vou fazer pela terceira vez a prova de seleção para me tornar Humano. 

Meus livros sempre receberam críticas terríveis. 

- Um soldado para a raça pura podia enforcar um músico da raça impura sem que a Justiça pudesse fazer nada. 

O valor do que alguém faz depende de estar no Livro dos Humanos.

Trabalho e terror. Quase não humanos vistos com um livro são incinerados. 

O Sacerdote diz que, apesar do corpo padecer, o Espírito da Nação está sendo Libertado. 

Os subversivos perdem pontos e podem ficar sem trabalho. As pessoas são incentivadas a viver o agora.

- Um governador da raça pura podia jogar uma bomba sobre o bairro da raça impura e construir em cima a cidade pura. 

Queimamos o Livro dos Humanos.

A multidão saiu para a rua e derrubou o tirano. 

*

AJR

segunda-feira, abril 05, 2021

sábado, março 27, 2021

sexta-feira, março 26, 2021

Live: Machismo Estrutural


 

Três bombas

 A primeira bomba matou mais de 100 mil. 

Eles haviam criado um julgamento controlado, submetendo o líder do Movimento a tipos sutis de tortura. 

Os ossos radioativos foram enterrados numa vala comum sem direito a reconhecimento. 

 A segunda bomba matou pouco menos de 150 mil. 

Algo estava operando nas sombras. Ninguém sabia a origem das bombas. A eleição se aproximava. Usei meus poderes para evocar os espíritos que poderiam me dar Visão.

Era uma entidade poderosa a que controlava o processo. Usava uma horrenda máscara amarelada e um manto escuro. Eu vi como planejava espalhar uma infecção, a enfermidade ia deformando o corpo humano, era como um exército de porcos. 

Ninguém acreditava em minhas profecias. Eles elegeram o Rei Armado. Quem operava o país parecia ser a própria Morte. Resolvi sair da cidade. 

O terceiro impacto matou mais de 200 mil. 

*

Afonso Jr. 





domingo, março 21, 2021

terça-feira, março 16, 2021

Uma lua

Um exército e uma aurora caminham juntos. 

Os Cânticos 


- Se hoje fosse antes... - disse o juiz. 

O escrivão fez o que pode para me defender. 

- Vou contar uma parábola - disse o juiz. Era um planeta cuja atmosfera era verde e animais coloridos circulavam pela terra. 

- E? - eu perguntei. 

- Você nunca leu a Bíblia? - perguntou o juiz.

Eu tentava lembrar do que havia acontecido. Perguntei:

- O senhor sabe quem foi que me interrogou?

- O mesmo que interrogou o homem dos fornos.

- Os fornos que quebravam todo dia. Demorou a melhorar - disse o promotor. 

- Se pelo menos você pudesse ver o quadro maior - disse o juiz. 

- O homem que me interrogou sabia algo sobre meu passado? 

Parecia lembrar que eles me haviam levado até a máquina. O cheiro me fez desmaiar. 

O promotor olhou pela janela, como que pensando não ser fácil acusar o sistema.  

- Eu era um escritor! 

 - Culpado!

- Mas por quê? - perguntei.

- Hoje é quarta-feira. 

E já chegara o azul do crepúsculo.

O promotor me disse baixinho enquanto eu saía algemado:

- Logo vem a lua nova. 

*

Afonso Jr. Lima 


quarta-feira, fevereiro 24, 2021

O dia em que Branca de Neve saiu para caçar

É hora da história. 

A rainha não percebera que o espelho estava sem o pano negro. 

O reflexo saiu com a luz da lua. 

Branca de Neve senta na floresta e canta sua canção. Os animais a rodeiam. Percebem tarde demais que não podem se mover. 

Ela volta para casa mais corada. Naquele diz, decide que vai mudar: uma criança?

Por que os pequenos sugavam seu sangue?

Ela acabara por se acostumar. 

O monstro-rainha havia perseguido Branca na floresta. 

Ele sente o cheiro. 

Agora, Branca aproxima-se da pequena que acordou com seu canto do lado de fora da janela. O monstro-rainha aponta sua flecha. 

*

Afonso Jr. Lima 




segunda-feira, fevereiro 15, 2021

Filhos da noite - dramaturgia

Filhos da noite

dramaturgia - 2017

Sofia

Eu li aquele livro. As casas de madeira cheias de ratos e pulgas. As chamas se espalham. A peste toma conta da cidade. Os viciados são internados em hospitais macabros e submetidos a todas as humilhações.


domingo, fevereiro 07, 2021

Peça: VNCNT - 2012

Dramaturgia sobre Vincent van Gogh (1853 - 1890)

VNCNT 

sexta-feira, fevereiro 05, 2021

A bala e o pássaro

vozes na minha janela

desperto e sol e disputa

mas não é de verdade disputa

é alimento, divisão


algo distrai e chama

o barulho é grande demais

nem silêncio poético sobrou 

despertar com letra impura 

a consciência quebrada 


vozes na minha janela

um debate em torno do pão

queria contar de pico e pena

alimentando o irmão


falar de bala e de pele

de vermelho e sonho quebrado

de um país e seu medo

ao poeta é ofertado


assim me quebro e viajo

por homens, serpentes e pastos

crescendo no úmido verde 

falando por todos os seres


humanidade, suas metades 

e assim segue a esperança

quando morre outra criança

vozes na minha janela


Afonso Lima 

quinta-feira, fevereiro 04, 2021

Basta

O que saber desse mundo?

O que posso, o que junto?

Cada povo tem seu culto

Não sei ler, sou oculto

Uma rápida olhada já diz tudo

Passado presente e futuro 


Afonso Jr.


quinta-feira, janeiro 28, 2021

O monstro

A dona de loja no shopping estava atendendo uma senhora porque era horário de almoço da funcionária. Subitamente, parou e ficou imóvel. A cliente a chamou duas vezes, até que ela respondesse. 

O jovem olhava a paisagem diária pela janela do ônibus, o mesmo horizonte dia após dia para chegar no trabalho. Seu colega não o conseguiu acordar quando chegou o ponto e desceu. 

A senhora idosa parou no equipamento de ginástica e o instrutor não a pode mover. Era preciso sair. Os seguranças foram chamados. 

Na escola, ela era chamada de monstro. Seus pais foram chamados.

A dona de loja do shopping parou na pequena faixa de sol que caía do teto de vidro. Tirou os sapatos. 

O jovem deitou na grama do parque depois de sua namorada pedir dois sorvetes ao vendedor. Ele não respondeu mais. 

A senhora idosa ficou sentada ao lado da janela na churrascaria perto do pequeno jardim. Precisavam fechar o restaurante. 

Seus pais foram chamados. Disseram que ele se vestia como menina. 

- Sim, isso é o que ele quer. 

- Mas não podemos evitar que seja hostilizada - disse a diretora. 

A dona de loja do shopping passava o dia todo no jardim de sua casa em pé, sem sapatos, olhando para cima. 

O jovem deitava o dia todo na grama do parque ao lado da fonte de cerâmica árabe. Sua namorada não ligava mais. 

A senhora idosa deitada na cama recebendo a luz do sol. Já não comia. 

- São as árvores, disse a menina na escola. As árvores estão mandando um sonho acordado para transformar as pessoas em coisas verdes. 

Os meninos a cercaram com pedaços de pau. Quando a professorra chegou, já estava morta. 

Afonso Jr. Lima


quarta-feira, janeiro 27, 2021

O testamento de Zaborovna

A prostituta Zaborovna havia sido sacrificada na casa de carnes na terça-feira. Ela fora usada por um AN-sapiens para alimentar os novos répteis do Laboratório Beta. Ela vivera durante dois anos trabalhando para o exército no círculo Polar.

Sua irmã Zhueya vivia no planeta M2, casada com o comandante "Gigante" Gall, havia sido elevada à aristocracia quando casou, permitindo que sua pele fosse despigmentada. Ela retornava para uma cerimônia oficial, o recebimento dos dentes, sempre recolhidos pelos AN-sapiens. A escravidão sexual fazia parte da vida de muitas mulheres humanas. 

Zhueya pesquisava de forma secreta os "esquadrões do genocídio", quando os animais aperfeiçoados no laboratório começaram a pagar para exterminar humanos: de 7 bilhões, a população caiu a 1 bilhão em poucas décadas. 

Eles queriam as terras para seus próprios negócios. Os filhos produzidos nos bordéis do Exército serviam para alimentar famílias AN-sapiens na Califórnia. 

Ela entrou numa das ruas degradadas de livreiros humanos à busca de documentos. Na livraria do seu amigo Monkey, foi abordada por um sujeito sujo chamado Mick D. Seu último trabalho tinha sido violar sepulturas abandonadas em busca de tesouros. 

"Gigante" Gall veio buscar Zhueya, que parecia abatida na Estação do Norte. No bolso, ela levava uma carta do túmulo de um cientista escrita numa antiga grafia. Era possível acabar com os AN-sapiens. 

Afonso Jr Lima 





Live: Dia Internacional em Memória das Vítimas do Holocausto


 

domingo, janeiro 10, 2021