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quinta-feira, abril 26, 2018

O beijo da morte

A solidão de um país, travessia incompleta, a oligarquia não desiste, as comunicações não mudaram, a nação desertificada pelo crime sem castigo, a madrugada traz o fogo e o frio cai sobre o homem anestesiado pelo álcool.

são paulo perigo e progresso

tanto cresce tanto aço luxo

produzido entregue

massa imunda seca vida

você tem fome

ergue esse cartaz

mecanismo silencioso

você mostra o mal

Como dizer isso eu me observo como animal no gelo, na parede da cidade a rachadura, o canto dos soldados, eu tenho que dizer desse grupo mínimo, solto entre engrenagens firmes, no meio da fumaça que nos cega.

solidão da cidade confinada

no templo um canto um gemido vida

aceito o novo acolho estranho

aventuras de medo e sonho

esse menino pensou que iria ler um livro

e a ele olhariam com sorriso amigo

seu pai não sabe o que fazer agora

Agora eu paro em frente a uma confeitaria. Um rapaz tem a camisa rasgada e a calça mais ainda. Eu não posso comprar nada. Eu caminho pelo parque pensando que algo mudou. Um homem parece mudar seu curso. Perdidos, fora da conta. Os olhares são mais sinistros. Eu encurto o exercício.

você teme foi derrotado

perdeu as peles

arte língua a esperança

feroz você animal

leopardos lantejoula e brilho

produz se cria fome o desespero

serpentes da terra buscando respiro

ataque o amanhã é soco

famílias sob fogo policial

Como dizer quando do jovem pobre atrás do balcão foi tirado a capacidade de saber quem é. A lei com seu ódio cada dia muda sua estratégia. A aura de glória usada para fins cruéis. Mas ninguém quer sujas as mãos com um acusado.

ser empresário gana de família pobre

senso comum ser autodestrutivo

no escritório negócios com a vida

recolhe o lixo faz telhado

você não sabe mais

ergue esse cartaz

você tem fome

O escritório de poesias olho o relógio tantos maços de senso comum por hora, tanta bruta injustiça por dia, o horror das instituições, porque linguagem faz tudo que é concreto.

o pano sujo a roupa rasgada

observe a mulher sem sapatos e louca

pensa na rua a jovem que imaginou

bonito filho e paga em dia casa

caça de corpos divas divergentes

A lua acolhe o beijo e o sangue, algum poema disse. Minha função é pensar com o coração. E eu mesmo fico preso nas imagens dos espelhos, eu já não acho o tiro certo que retrata o coração esmagado da tragédia.

luto e ódio porque já não é gente

processo preconceito varre tudo

observe a criança suja a mãe triste

você é meu irmão

você quer mais

você é mais que bicho

ruínas de verso o vento calculado

a alma da cidade que cai desse edifício

Eu ouço a palestra. Eu anoto. Eu ouço o mestre. Eu reflito. Eu anseio em giro interno eu volto. Alguma coisa muito errada segue seu curso. Alguma coisa que esqueceu da sensata incerteza.

pelas ruas surgirão pedintes

entrega rápida encomenda triste

alguma coisa se perdeu no mecanismo

o tradicional ritmo já não serve

evolução sem parada do verso 

observe o jovem sem esperança

Agora a máscara de uma alma exilada, agora a máscara de uma resignada aflição, panorama de horizonte em guerra.

primavera-morte em ebulição

as mãos multidão criada e crescida

método milhares de bocas famintas 

o pomar dos venenos hoje alimentado 

a escuridão ouve mais um grito

A noite avança. Eu me calo. Por que não o silêncio? Acerto os livros. Limpo a estante. Cuido da planta. A eterna angústia de dizer que a história nunca acaba.

silêncios a dor e você

ergue esse cartaz

você mostra nossa alma podre

todos merecem a paz e o progresso

todos merecem dormir em não pedra

tiraram a pele de gente do sem teto

ninguém nasceu para o inferno

a névoa cruel que encobre o pensamento

avenida são paulo o crime arma fria

não tenho metáforas para tua pele cinzenta

nem rima que possa nesse calafrio

onde os amigos a jaula de ouro

É isso que eu sou. Eu ouço as vozes, eu tento a mancha, a veloz sombra se cala. Eu tento telepatia, as lacunas que te fazem ver. A água corre e eu preciso sonhar. Eu sou o ouvido universal. 

a obra segue rompe o ser mutante

o pássaro canta mesmo na gaiola

retalhos de cor e borda um novo dia

minha escrita salta e já não segue a forma

meu coração lembra canção

e fantasia contada ao pé do ouvido

a tribo existe e o sentimento que era

grita a cidade por esses esquecidos 

olhar sedento máfia linha reta

a força bruta lei justiça e letra 

quero ter um riso e um suspiro ainda

um dia a mais de luta desconhecido 

em nome da paz sempre silenciada


Afonso Jr Ferreira de Lima





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