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sexta-feira, julho 08, 2011

TENDÊNCIAS/DEBATES

Imobiliária Prefeitura S.A.

JORGE EDUARDO RUBIES


Com a venda do "quarteirão da cultura", os políticos de nosso município perderam mais uma chance de mostrar que estão realmente a serviço do cidadão

Em meio ao festival de leis absurdas, inconsequentes e patéticas de autoria do Executivo, aprovadas a toque de caixa pela Câmara Municipal de São Paulo às vésperas do recesso de julho, é difícil apontar qual é a mais contrária ao interesse público, mas a venda do "quarteirão da cultura" do Itaim Bibi desponta como uma das favoritas.
Votada na calada da noite (às 23h30!), essa lei oferece de repasto à farra imobiliária -que dá sinais de iminente colapso- um oásis de beleza e paz num dos bairros mais áridos e congestionados da cidade.
Concebido nos anos 50 de acordo com o conceito de escola-parque, revolucionário até hoje, o "quarteirão da cultura" é um terreno municipal de 20 mil m2 com a maior densidade arbórea do Itaim.

Ele congrega quase todos os serviços públicos da região -duas escolas, teatro, biblioteca, creche, unidade da Apae, posto de saúde e Centro de Atenção Psicossocial-, reconhecidos por sua excelência e que atendem diariamente a milhares de usuários, sendo que alguns dos prédios foram recentemente reformados e reinaugurados com fanfarra pelo próprio prefeito.
O pretexto para sua venda e consequente destruição é a construção de 200 creches, o que não passa de uma farsa pessimamente encenada, pois dinheiro é o que não falta para tanto, a começar por verbas federais e estaduais disponibilizadas para a prefeitura e não utilizadas.

Sem falar no fabuloso Orçamento municipal de R$ 35 bilhões, suficiente para cumprir essa e todas as outras promessas de campanha do prefeito, desde que utilizado com um mínimo de eficiência.
De fato, é inacreditável que a prioridade da prefeitura seja a venda do quarteirão, e não o corte de parte das cerca de 30 secretarias municipais, das centenas de cargos em comissão, da verba para propaganda oficial (superior a R$ 100 milhões em 2010) ou dos R$ 191 milhões gastos em consultorias (que a Folha noticiou nesta semana)...
A pá de cal na farsa foi dada pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, que esclareceu que a eventual venda desse e de outros nove terrenos municipais só pode servir ao pagamento de precatórios.

E apesar disso, da abertura de processo de tombamento do quarteirão pelo Condephaat -que reconheceu o relevante valor histórico, urbanístico, paisagístico, ambiental e social do local-, do repúdio de grande parte da população do bairro e da sociedade à iniciativa, expresso em abaixo-assinado com 12 mil assinaturas, de um abraço no quarteirão que reuniu mais de mil pessoas e de diversos atos e manifestações, a prefeitura e a Câmara insistem na ideia.
Enfim, estamos sempre prontos a debater com as autoridades municipais acerca de nossa convicção da lesividade da venda do quarteirão, convite por elas declinado nas duas audiências públicas convocadas para discutir o assunto.

Não entrarei nos detalhes sórdidos, como a pressão a funcionários municipais que aderiram ao Movimento SOS Quarteirão do Itaim, mas vale sempre lembrar que o prefeito e mais de 20 vereadores da cidade chegaram a ser cassados em primeira instância pelo recebimento de doações ilegais provenientes de uma entidade de fachada do setor imobiliário.

Com a aprovação desse e dos outros projetos, os políticos do município perderam mais uma oportunidade de mostrar que estão realmente a serviço do cidadão, e não dos doadores de campanha.
Isso num momento em que, no mundo inteiro, a paciência do povo com seus supostos representantes começa a se esgotar. Afinal, a Grécia, a Espanha e o Egito também são, ou haverão de ser, aqui.

JORGE EDUARDO RUBIES é presidente da Associação Preserva São Paulo, coordenador do Movimento SOS Quarteirão do Itaim e coordenador-geral da União de Movimentos contra a Especulação Imobiliária e pela Ética na Política.


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